26 de janeiro de 2010

QUEM PODE SER FRANCISCANO SECULAR?

Critérios de chamamento

Frei Almir Ribeiro Guimarães, OFM (*)

1. Nossas fraternidades franciscanas seculares estão espalhadas pelo mundo afora com suas luzes e sombras. Elas são constituídas de irmãos e irmãs que, impulsionados a atingir a perfeição da caridade no próprio estado secular, são empenhados pela Profissão a viver o Evangelho à maneira de Francisco e mediante a Regra aprovada pela Igreja ( cf. Regra,2). Entre nós há fraternidades vigorosas e outras envelhecidas e desmotivadas. As portas de tais fraternidades estão abertas a todos os que quiserem privar de nossa maneira franciscana de viver a fé e o evangelho.

2. Os que ingressam na Ordem são seculares, pessoas que vivem no mundo, na família e no trabalho. Normalmente tais pessoas não devem estar submersas por tantas atividades em suas paróquias de tal forma que a Ordem será um apêndice sem importância de suas vidas. Insistimos no caráter secular. Pensamos num laicato marcado pelo ver-julgar-agir. Não basta apenas um laicato devocional e que realiza algumas funções pastorais e litúrgicas. Queremos leigos que estejam num crescimento de sua vocação no meio do mundo. Os franciscanos seculares são leigos de verdade. Nunca é demais insistir nesse aspecto.

3. Podem ser chamados para fazer parte da Ordem Franciscana Seculares aqueles que andam numa séria busca de Deus, que não se satisfazem com a missa dominical e com meia dúzia de práticas religiosas. São pessoas que, aqui ou ali, descobriram Cristo existencialmente e desejam, à maneira de Francisco, segui-lo e compreender melhor seu mistério de abaixamento e kénose. Os melhores candidatos para nossas fraternidades são aqueles que estão em busca. Nunca se haverá de esquecer que os que ingressam na Ordem respondem a um chamamento. Os melhores candidatos são aqueles que têm senso critico diante de comunidades alienadas e preocupadas apenas com o devocional e com uma dimensão caritativa assistencialista ou cultivadores exageradas de emoções.

4. Podem ser chamados para a Ordem Franciscana Secular rapazes e moças, homens e mulheres, solteiros e casados que experimentam vontade de viver o Evangelho e não apenas seguir uma religião formal e legalista. Os que gostam de rezar no silêncio do quarto, os que quando solicitados além do manto dão a túnica, os que não andam atrás de honras e cargos, os que não contentam com aparências e buscam o cerne das coisas. Os franciscanos seculares sentem nos lábios o gosto da espontaneidade como Francisco acolhia os pedidos e exigências do Evangelho.

5. São aptos para fazer a caminhada espiritual da Ordem Franciscana Secular os que desejam desvencilhar de certas amarras da sociedade: dinheiro, sempre mais dinheiro, profissão rentável, sempre mais rentável, sociedade de competição e de esquecimento dos outros, sociedade que usa as pessoas como coisas. Não estão de acordo com o individualismo e o regime ou império do provisório. No fundo, os franciscanos seculares são pessoas contestadoras de uma sociedade que não tem senso crítico, mas cria robôs.

6. Os franciscanos seculares consideram como elemento fundamental de seu modo de viver, de seu gênero de vida a vivência em fraternidades. Os grupamentos em que vivem se chamam fraternidades. Há o sacramento da reunião geral, das visitas aos mais precisados, da oração em comum, da troca de idéias, do carinho mútuo prestado aos de dentro. Muitos que se aproximam da OFS querem ardentemente viver em fraternidades de vida e de oração. Até que ponto as reuniões ferais das fraternidades são expressões eloqüentes da vida de irmãos? Os que não estão dispostos em viver a fraternidade são desaconselhados de entrarem na Ordem Franciscana Secular.

7. Finalmente são excelentes candidatos para a OFS aqueles que estão dispostos a ir pelo mundo, juntos com outros irmãos, fazendo-se presentes na vida de doentes, detentos, dos que precisam encontrar um sentido de sentido de vida. Os que recriminam uma Igreja acomodada sentir-se-ão bem em fraternidades que se querem missionárias.

8. Antes da inserção de novos membros em fraternidades já existentes será preciso que os candidatos sejam apresentados à Ordem em reuniões descontraídas, sem formalismo. Parece importante que candidatos à Ordem participem, durante um tempo, de círculos descontraídos e que permitirão clarear o horizonte antes do começo da formação. Um grupo de simpatizantes com a presença de alguns irmãos, antes dos trâmites normais jurídicos, poderá ser de bom proveito. “Antes do noviciado deveria haver um noviciado para o noviciado”.

(*) Frei Almir Ribeiro Guimarães, OFM
Assistente Nacional da OFS pela OFM e Assistente Regional do Sudeste III

20 de janeiro de 2010

ORIGENS DE CLARA

ORIGENS DE CLARA

Frei Almir Ribeiro Guimarães, OFM

As Edizioni Poziuncola, de Assis, publicaram um alentado estudo sobre Clara de Assis da autoria de Chiara Giovanna Cremaschi, conhecida autora de textos sobre a vida das Irmãs Pobres de São Damião (Chiara di Assisi. Um silenzio che grida, 2009). Desta obra colhemos as informações que agora apresentamos a respeito das origens de Clara.

1. Clara nasceu na cidade de Assis em 1193. Segundo uma antiga biografia o fato ter-se-ia dado a 20 de maio. Nasce numa família da pequena nobreza do interior, conhecida como aristocracia. Em sua casa haviam sete cavaleiros todos nobres e poderosos (cf. Proc 19, 1). As origens de seu nome de família devem ser buscadas num castelo nobre do condado. De seu lugar de origem, seu antepassado, conde Bernardino, há uns cinqüenta anos havia se transferido para a cidade e construído um palácio com torre, símbolo da nobreza e do poder, na praça da Catedral dedicada a São Rufino. João de Ventura de Assis, no Processo de Canonização, descreve o modo de se viver na casa: “Ainda que a corte de sua casa fosse das maiores da cidade e lá se fizessem grandes despesas, ela deixava de lado e guardava os alimentos que lhe eram dados para comer, na fartura de uma casa grande...” Nada faltava, nem mesmo para os fâmulos.

2. Não temos condições de saber o sobrenome familiar e nobre. Tudo leva a crer que Offreduccio já estaria morto no momento do nascimento de Clara. No palácio viviam seus filhos e respectivas famílias. Monaldo é o chefe, porque o mais idoso. Entre os outros se pode contar Simão, pai de Rufino, que ingressaria no grupo dos irmãos de Francisco de Assis e por fim Favarone. No Processo de Canonizaçao Pedro de Damião da Cidade de Assis, diz ter conhecido o pai de Clara, messer Favarone, nobre e grande poderoso na cidade. Clara pertence às vintes famílias nobres de Assis

3. “Segundo certos estudiosos o nome Favarone indica a nobreza de quem o tem, segundo outros é um sobrenome que se dava a quem queria aparecer mais do que era”. Na verdade, é o filho mais novo, e por costume é um miles, um cavaleiro armado, muitas vezes ausente de casa. É pouco conhecido de seus concidadãos. Casou-se com uma nobre da cidade a respeito da qual, segundo alguns, não se conhece o verdadeiro nome. Há os que afirmam que o nome de Ortolana é índice de alta nobreza, para outros trata-se de um nome que lhe foi dado por ter colocado no mundo criaturas como flores.(Ortulana-Hortelã). Estamos diante uma mulher dotada de grande capacidade e de profunda fé cristã que é sem mais adomina, a senhora do palácio, colocada à frente das outras mulheres e da criadagem. É cercada do afeto e da amizade de muitas senhoras aristocratas que freqüentam sua casa. Havia uma convivência entre essas mulheres; os trabalhos que realizavam juntas nos mesmos cômodos, favorecia a partilha de pensamentos e de desejos. As freqüentes ausências do marido davam a Ortolana ampla liberdade de movimento. Ela se dirigia em peregrinação a vários lugares que eram metas habituais da Idade Média, até meso à Terra Santa.

4. Enquanto espera seu filho . reza diante do Crucifixo pedindo ajuda para o momento do parto. Num determinado momento ouve uma voz que lhe diz: tu darás à luz uma criança que iluminará o mundo. Não é aqui o lugar de discutir sobre o modo como se deu tal fato. A voz explica as razões pelas quais a filha recebeu o nome de Clara. Em latim Clara significa ilustre, famosa e segundo alguns esse nome só era dado a mulheres da aristocracia. Recebendo esse nome de Clara, na língua popular da Umbria, atribui-se ao termo a característica da luminosidade.

5. Celano pinta Ortolana como protótipo da mulher assisiense, com o escopo de apresentar um modelo de mulher para aquelas que não podiam seguir Clara em tudo. “Sua mãe, Ortolona que devia dar à luz a planta frutífera no jardim da Igreja, também era rica em não poucos bons frutos. Embora fosse presa aos laços do matrimônio e aos cuidados familiares, entregava-se como podia ao serviço de Deus e a intensas práticas de piedade. Tanto que, por devoção foi com os peregrinos ao ultramar e voltou toda feliz, depois de visitar os lugares que o Deus homem consagrou com suas pegadas. Também foi ao santuário de São Miguel Arcanjo para rezar e visitou piedosamente a as basílicas dos apóstolos.

Em fevereiro, "A infância de Clara"

Santo do Dia - São Sebastião
















Sebastião

São Sebastião nasceu em Milão, conforme relatos deixados por Santo Ambrósio e Santo Agostinho. Era um valoroso capitão do exército romano, pertencente à primeira corte da guarda pretoriana. Sofreu o martirio no reinado do Imperador Diocleciano, que exercia forte perseguição aos cristãos mas, no entanto, era muito amigo de São Sebastião. O Santo aproveitava dessa influência para pregar aos soldados e a toda a população a fé em Cristo, com descrição para evitar que o imperador soubesse. O próprio governador de Roma, Cromácio, e seu filho, Tibúrcio, foram por ele convertidos e confessaram a fé mediante o martírio.

Denunciado como cristão, São Sebastião foi levado perante o imperador para justificar tal procedimento. Diante do imperador manteve-se firme e não renegou sua fé. Sentindo-se traído em sua amizade, Diocleciano ordenou que São Sebastião fosse condenado à morte. Amarrado a um tronco foi varado por flechas, na presença da guarda pretoriana. Apesar dos soldados o terem dado como morto, as flechadas não conseguiram matá-lo, e corajosamente se apresenta perante o imperador, censurando-o pelas injustiças cometidas contra os cristãos, acusando-os de inimigos do Estado. Diocleciano permaneceu surdo aos seus apelos, e ordenou que São Sebastião fosse espancado até a morte e jogado em uma vala comum, uma mulher piedosa e cristã conseguiu retirar seu corpo dali e sepultá-lo nas catacumbas da Via Ápia, em Roma. Era por volta do ano 284.

São Sebastião é o padroeiro do Rio de Janeiro desde sua fundação por Estácio de Sá em 1565 no dia 1º de março, dando inclusive nome à cidade: São Sebastião do Rio de Janeiro. A origem da homenagem deve-se ao fato de o dia de São Sebastião ser comemorado no mesmo dia em que os portugueses venceram a batalha contra os franceses na mesma região.

17 de janeiro de 2010

ZILDA ARNS

Hoje, a terra acolhe a fecunda semente da mulher cuidadora. No céu, a festa já começou há dias. Um encontro entre céu e terra de uma alma imortal e de uma obra que será perene. Hoje, em Curitiba, Zilda Arns, velada, amada, sepultada e eternizada. Uma mulher profundamente mãe, daquelas que o eu desaparece e só transparece a obra. Quem conhece a arte de amar, aprende a criar como o Criador. Assim foi Zilda, uma mulher que salvou e reconstruiu vidas.

Hoje, a subjetividade desta mulher é exaltada, pois sua vida foi fazer da objetividade uma missão. Ela, muitas vezes, ficou hospedada aqui em casa. Observei-a com reverente silêncio. Vinha aqui como irmã, alma franciscana, e bebia a presença e orientação de confrade, seu orientador espiritual. Sentava-se à mesa, rezava conosco e contava histórias. Era versada na ciência do Amor e familiarizada com as crianças do mundo inteiro. Passava uma confiança muito grande. Ganhava presentes e distribuía palavras e sorrisos.

Hoje, eu tenho que escrever sobre Zilda de quem só se fala bem. Conhecida pela solidariedade e pela força feminina aliada a empreendimentos e a coragem de fazer o que muitos poderes não fazem. Zilda valia mais que muitos governos!

Hoje , ao acompanhar o velório e o enterro de Zilda, eu tenho que perguntar: O que fazemos com a nossa capacidade de Amar? Ela, nos ensina que amar não basta, é preciso dar um sentido forte a este amor. Ela ensinou isto a todas as mulheres e homens da Pastoral da Criança. Zilda, a pastora incansável do Cuidado pela Vida. Ela deu às milhares e milhares de crianças a chance de viver, de brincar na infância, de alimentar-se, de sentir o banho sadio na água purificadora do asseio. Santo remédio!

Obrigado Zilda Arns! Você nos ensinou a verdade de Amar, a eternizar-se no tempo. Você ensinou que o grande objetivo da vida é a própria Vida. Você nos ensinou a constância, o desapego do status, a constância, a discrição, a habilidade para conversar, a ousadia, a conhecer as melhores intenções do que nos resta de cidadania, a ausência de complicação, a simplicidade da obra social, a compreensão rápida. O seu zelo fez sua estrada de imortalidade. Um terremoto a matou fisicamente, mas você criou em nós um abalo enorme de consciência! Descanse no Prêmio Nobel da Paz do seu Dever Realizado!

15 de janeiro de 2010

Nota da CNBB em solidariedade ao povo do Haiti

A Igreja no Brasil está se mobilizando em favor dos necessitados no Haiti. Em nota divulgada hoje, o presidente da CNBB, dom Geraldo Lyrio Rocha, e o presidente da Cáritas Brasileira, dom Demétrio Valentim, lançam oficialmente a Campanha SOS Haiti, em solidariedade ao povo caribenho, atingido pelo pior terremoto dos últimos 200 anos.

”Neste momento, são necessárias iniciativas que demonstrem solidariedade internacional”, diz um trecho da nota. A Cáritas Brasileira esta produzindo o material publicitário a ser divulgado nas rádios e Tvs de todo o país.

Leia a íntegra da nota abaixo:

SOLIDARIEDADE AO POVO DO HAITI

“Esperando contra toda esperança” (Rm 4,18)

Em meio às desalentadoras notícias que chegam a cada momento, dando conta das trágicas consequências do terremoto que afligiu o Haiti, ceifando tantas vidas e colocando abaixo trabalhos e sonhos, a Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB) se une à multidão de homens e mulheres que, nestas circunstâncias, têm “a ousadia de quem se atreve a esperar contra toda esperança”, para apresentar à Igreja e a todo povo do Haiti a solidariedade em orações, palavras e gestos.

Neste momento, são necessárias iniciativas que demonstrem solidariedade internacional, como, por exemplo, o perdão imediato de toda a dívida externa do Haiti, que corresponde a 30% do seu pobre orçamento, e ações humanitárias que amenizem a dor e reanimem a esperança do povo haitiano.

Movida por este sentimento de solidariedade, a CNBB e a Cáritas Brasileira lançam a Campanha SOS HAITI, em socorro à população atingida pelo terremoto.

Conclamamos todas as comunidades eclesiais, paróquias e dioceses a promoverem, no próximo domingo, dia 17, ou no dia 24 de janeiro, ou em outra data conveniente, orações e coletas em dinheiro para as vítimas do terremoto no Haiti. Assim, nos unimos à campanha mundial promovida pela Caritas Internationalis em resposta ao apelo do papa Bento XVI.

As doações poderão ser depositadas nas contas: Banco do Brasil - Agência: 3475-4 - Conta Corrente: 23.969-0; Caixa Econômica Federal - OP: 003 - Agência: 1041 - Conta Corrente: 1132-1; Banco Bradesco - Agência: 0606 - Conta Corrente: 70.000-2.

Que a graça de Deus fortaleça nosso compromisso de caridade fraterna, inspire nossa generosidade e anime quem está a serviço das vítimas no Haiti.

Brasília, 15 de janeiro de 2010

D. Geraldo Lyrio Rocha
Arcebispo de Mariana
Presidente da CNBB

D. Demétrio Valentim
Bispo de Jales
Presidente da Cáritas Brasileira

8 de janeiro de 2010

Palavras de Fé

Até Francisco, o cristianismo vivia a dimensão vertical: todos são filhos e filhas de Deus. Com ele, começou a se viver a dimensão horizontal: se todos são filhos e filhas, então todos são irmãos e irmãs. Não apenas os humanos, mas cada ser da criação.

Leonardo Boff

1 de janeiro de 2010

Para um ano Feliz

Estamos no início de um novo ano e faço votos que os leitores estejam bem dispostos a fazer o caminho que temos pela frente. Quando termina um ano e inicia um novo, as preocupações e atitudes das pessoas são muito diversificadas: consulta de cartomantes, adivinhos ou videntes, amuletos para espantar os males, uso de roupas “para atrair a sorte”, certos tipos de comida ligados a bons presságios... Sem falar do espocar de champanhes e foguetes, para “acordar as forças cósmicas e atrair bons fluidos”, mesmo se, depois, é mesmo a ressaca que vem e o ar fica poluído, de tanto enxofre liberado em forma de som e luzes coloridas... Isso tudo adianta alguma coisa?

Há, certamente, um incentivo difuso e insistente na opinião pública, e já incrustado na cultura, para confiar a não sei quê tipo de forças ocultas a condução dos destinos de um ano que começa. Será o medo de encarar a responsabilidade sobre a própria vida? Será pouca fé em Deus? Mesmo assim, será a necessidade de crer e de confiar em “alguma coisa”, que seja mais poderosa que nós mesmos e nos ajude a enfrentar o desconhecido que se abre diante de nós a cada início de ano? São Paulo já chamava a atenção dos Colossenses, também eles ainda sujeitados ao medo do acaso e de forças cósmicas desconhecidas, dando atenção a “teorias e conversas sem fundamento.... segundo os elementos do cosmo, e não segundo Cristo: que ninguém vos engane!” (cf Cl 2,8).

Um dia sucede a outro e não é a virada da última folhinha do calendário que vai trazer, magicamente, alguma mudança na vida; nem será ela capaz de desencadear forças ocultas, que tragam o bem ou o mal... Cada ano, cada mês, cada dia, hora e minuto são um presente de Deus para nós. “Quem, com suas preocupações, é capaz de acrescentar um só dia à duração de sua vida?” – perguntava Jesus (cf. Mt 6,27). É Deus o senhor do tempo e da história; foi Ele que nos tirou do nosso nada e nos fez entrar no tempo (quem, por si mesmo, decidiu nascer?); a cada manhã, acorda-nos novamente para a vida e nos chama a sermos construtores da nossa história, a colaborar na sua obra, livre e generosamente. Mostra-nos o caminho e nos convida a seguir por ele; ilumina nossos passos, se queremos andar na sua luz; quer ser nosso companheiro de caminho no peregrinar pelo tempo, se aceitamos sua companhia...

O início de um novo ano, portanto, é tempo para renovar nossa fé em Deus, aderindo com confiança aos seus desígnios sobre nós e o mundo. Com o salmista, peçamos também nós cada dia: “ensinai-nos a bem contar nossos dias e dai ao nosso coração sabedoria!” (Sl 90,12). Sim, boa sabedoria é conhecer os caminhos de Deus e tomar a decisão de seguir por eles. São seguros e nos permitem andar com liberdade na direção boa, dando sentido à vida: “Mostrai-me, Senhor, os vossos caminhos para que eu caminhe na vossa verdade” (Sl 86,11). O novo ano será tão bom quanto nós o fizermos acontecer, com a ajuda de Deus. Não será bom, se nós, ou outros, agirmos fora dos planos de Deus; nossas ações pessoais têm repercussões, não apenas sobre nós mesmos, mas também sobre os outros e sobre o mundo; para que o ano seja bom, é fundamental viver e agir de forma responsável cada dia, pensando no nosso bem, mas também no dos outros.

Não é o início do ano que faz o ano todo ser bom: o ano novo abre-se diante de nós como um projeto a ser realizado cada dia, com esforço e perseverança; por isso, a cada novo dia renovemos nossos bons propósitos e disposições. Por outro lado, iniciemos confiantes cada novo dia; Jesus ensinou que, “cada dia, bastam os próprios cuidados” (Mt 6,34). Se queremos passar bem o ano todo, elevemos cada dia nossa prece de confiança na vontade de Deus; e façamos o constante e honesto discernimento sobre aquilo que se passa ao nosso redor, para interpretar bem os “sinais dos tempos”; deixemo-nos conduzir pela mão de Deus: nos seus mandamentos e na sua Palavra Ele nos indica o caminho a seguir.

No início do ano, a Igreja invoca sobre nós a bênção de Aarão, que S.Francisco adotou como sua também: “O Senhor te abençoe e te guarde! O Senhor faça brilhar sobre ti a sua face e se compadeça de ti; o Senhor volte para ti o seu rosto e te dê a paz” (cf Nm 6,24-26). Ter Deus na vida, dá serenidade e paz ao coração. Nada pode abalar a quem segura firme na mão de Deus! Portanto, só me resta desejar a todos um feliz e abençoado ano novo! Com a graça de Deus e nosso esforço diário!

1ª SEXTA-FEIRA DO MÊS-AMAR SEM LIMITES

Antes da festa da Páscoa, sabendo Jesus que chegara a hora de passar deste mundo para o Pai, tendo amado os seus que estavam no mundo, amou-os até o fim (Jo 13, 1).

1. Ressoa sempre aos nossos ouvidos, principalmente nos momentos em que somos profundamente verdadeiros ou que fazemos a doída experiência do pecado, as palavras do quarto evangelista a respeito de Jesus: “Tendo amado os seus que estavam no mundo, amou-os até o fim”. Mais não podia amar, amou-os em extremo, amou-os sem limites. Um Deus que ama, que se contorce de dores e mesmo assim ama e deixa ainda que se lhe abram o peito para mostrar a fonte de tal amor, ou seja, seu coração.

2. Deus é uma fornalha de amor. Não é um policial que controla nossos gestos e palavras, não é o deus frio dos filósofos, não é um velhote bonachão que passa a mão em nossas cabeças perdoando nossas ingratidões. Deus é eternamente é amor. O Pai ama o Verbo e amor do Verbo pelo Pai se faz no laço do Espírito. Eterna doação de amor. Esse Deus resolve sair de si, criar, formar os humanos, colocar dentro deles um desejo de infinito, fazer deles objeto de seu amor sem limites. Deus fala ao homem por meio de toda a criação; céu, terra, abismos, gelo, neves. Bernhard Häring escreve: “O céu e a terra cantam a beleza da glória do Eterno. A criação é revelação da glória e do amor sobretudo através de sua beleza e prodigalidade”. Ficamos extasiados diante de tanto esplendor... Pena que os humanos estejam destruindo a criação que nos revela o amor do Senhor!

3. E a Palavra, o Verbo que está na criação ganhou carne, rosto e vida na figura de Jesus. Ele é o Emanuel, o Deus conosco, Filho do homem, um de nós. Deus colocou em Jesus não somente o seu poder, mas todo o seu amor. Cito ainda B. Häring: “Deus é nosso criador, o grande artista que faz de nós imagem e resposta ao seu amor. Mas isto ainda não basta: em seu Verbo eterno encarnado ele é, ao mesmo tempo, nosso irmão, o amigo mais íntimo, nosso Salvador, nosso médico divino, inclusive, segundo ousada imagem da Escritura, nada menos do que esposo de seu povo, de sua Igreja, da humanidade redimida”

4. O Verbo penetra sem reservas em nossa miséria. Coloca-se decididamente ao lado dos pobres e dos pequenos. O Deus grande e belo se acerca daquilo que é fragilidade. Assim, quer arrancar livremente de nós uma resposta amorosa. O Filho de Deus partilha nossos cansaços, nossa desilusão e nossa fragilidade. Carrega o peso de nossos pecados. Tem tanto empenho em nos arrancar da miséria em que vivemos que compassivo e abalado pelo pecado chega a suar sangue em Getsêmani. Sim, tendo amado os seus, amou-os até o fim.

5. No alto da cruz Jesus dá o sim definitivo ao mistério incompreensível do amor expiatório. Entrega-se à morte sem desespero e no meio de incredulidade e ódio dos circunstantes. O pecado é vencido e derrotado pela força e energia do amor de Jesus, amor sem limites. Um Coração que amou até o fim. Vale, neste contexto lembrar das palavras vigorosas de Paulo dizendo do amor do Pai por nós: “Quem não poupou o seu próprio Filho e o entregou por todos nós, como não haverá de agraciar em tudo junto com ele ?(...) Quem nos separará do amor de Cristo? A tribulação, a angústia, a perseguição, a fome, a nudez, os perigos, a espada? (...) Pois eu estou convencido que nem a morte, nem a vida, nem os anjos nem os principados, nem o presente nem o futuro, nem os poderes, nem a altura, nem a profundeza, nem qualquer outra criatura poderá nos separar do amor de Deus, manifestado em Cristo Jesus, nosso Senhor” (Romanos 8, 31ss).

6.O discípulo predileto, nas linhas seguintes da citação de abertura, vai falar do lavapés e da ceia com os apóstolos antes da partida. João tem o olhar voltado para o cenáculo. Cenáculo lembra Eucaristia. O mistério do amor e da autoaniquilação de Jesus é a prova mais acabada de amor. Quis Jesus dar uma presente supremo desse gesto no alto da cruz no sacramento do amor sob as espécies do pão e do vinho. Continua nos amando, amando até o fim. Convida-nos, a nós que participamos da Eucaristia, a darmos a vida pelo mundo. Permanecendo na Eucaristia Jesus quer atrair os corações. As batidas do coração humano de Jesus continuam na glória do Ressuscitado.

Nada e ninguém podem nos separar do amor de Cristo manifestado em seu peito amor, tão cheio de amor.

Texto inspirado no livro El Sagrado Corazón de Jesús y la salvación del mundo, Bernhard Häring, Ed. San Pablo, Ed. San Paulo, Bogotá, 1995, p. 20-25).