29 de novembro de 2012

Advento – Liturgia e espiritualidade



Por Frei Régis G. Ribeiro Daher

● O significado da palavra: vinda, chegada.

● O Advento é ponto de partida e ponto de chegada do ano litúrgico (espiral do tempo).

● A Igreja se prepara para o Natal, recordando o nascimento histórico de Cristo.

● O Advento apresenta sempre a tríplice “vinda” de Cristo: Cristo veio, Cristo vem, Cristo virá (ontem, hoje e sempre).

● É esta a chave de leitura dos textos litúrgicos do advento.

● Cristo veio. Mas de que adianta se ele não vem agora para cada pessoa? “Nós é que temos que nascer para Ele” (fr.Walter Hugo).

● O Advento é também o nosso tempo; estamos sempre no “advento” de nós mesmos. Cada um vive no Antigo Testamento de si mesmo.

● Celebrando sua vinda histórica, realiza-se sua vinda atual no mistério do culto, realizando-se assim, mais uma etapa da preparação da última vinda de Cristo.

● A Igreja vive e celebra esta tensão do “já presente” e do ainda “por vir”.

● Cristo é sempre aquele que ainda deve vir e continua chegando para cada um e para todo o mundo.

● O Reino messiânico já está presente pela justificação e pela graça. Mas ainda não está plenamente presente nos corações dos que creem no Senhor Jesus. É preciso que Ele venha para que se instaure o Reino de justiça, de paz, de reconciliação, onde todos se reconheçam irmãos.

28 de novembro de 2012

Visão de conjunto dos textos bíblicos do Advento



1º Domingo do Advento

Caminhar ao Encontro do Senhor que vem
1ª Leitura (Jr 33, 14-16) - Um novo nome para Jerusalém: “Deus nossa justiça”
Salmo responsorial: (Sl 25[24], 4bc-5ab.8-9.10+14) Deus bom, fiel, justo e verdadeiro manifesta a Aliança
2ª Leitura: (1Ts 3,12-4,2) Crescer sempre pela abundante caridade de Deus
Evangelho: (Lc 21,25-28.34-36) A vinda do Filho do Homem

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2º Domingo do Advento

Preparação para a vinda do Senhor
1ª Leitura: (Br 5,1-9) Um novo nome para Jerusalém: “Paz da Justiça e Glória do Temor de Deus”
Salmo Responsorial (Sl 126 [125], 1-2ab.2cd.3.4-5.6) Os grandes feitos de Deus para seu povo.
2ª Leitura: (Fl 1,4-6.8-11) Esperar o Senhor com coração puro e irrepreensível
Evangelho: (Lc 3,1-6) Vocação e pregação de João Batista

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3º Domingo do Advento

Alegria por causa da proximidade de Deus
1ª Leitura: (Sf 3,14-18a) Mensagem a Jerusalém: “O Senhor está no meio de ti”
Salmo responsorial: (Is 12,2-3.4bcd.5-6) Alegria; saciação nas “fontes da salvação”
2ª leitura: (Fl 4,4-7) “Alegrai-vos sempre no Senhor: ele está perto”
Evangelho: (Lc3,10-18) O que é a conversão para cada um

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4º Domingo do Advento

A irrupção do Mistério de Deus em nossa vida
1ª Leitura: (Mq 5,1-4 [2-5a]) De Belém sairá o Pastor de Israel
Salmo responsorial: (Sl 80 [79], 2ac+3b.15-16.18+19) O Pastor de Israel
2ª Leitura: (Hb 10,5-10): “Eis que venho para fazer tua vontade”
Evangelho: (Lc 1,39-45) A visitação de Maria a Isabel

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27 de novembro de 2012

Reflexão: Reflexo

  
“Quando você quer alguma coisa, todo o universo conspira para que você realize o seu desejo”. Paulo Coelho


O mundo é como um espelho que devolve a cada pessoa o reflexo de seus próprios pensamentos e seus atos. A maneira como você encara a vida é que faz toda diferença. A vida muda, quando você se dispõe a mudar, a deixar para trás aquilo que não convém, as coisas que atrapalham sua caminhada. Desejar é um querer absoluto, uma força que surge dentro de nós e nos impele a ir além das fronteiras.
Procure desejar coisas boas e positivas. Mentalize para você metas possíveis e disponha-se a trabalhar em favor de seus objetivos. Ninguém consegue vitórias sem esforços, sem sacrifício. E são justamente essas coisas que tornam as vitórias saborosas. Então, abra sua alma para a luz divina, permita que a bênção de Deus esteja em você. Siga em frente, persista em seu caminho e seja feliz com aquilo que Deus já lhe concedeu…


Frei Paulo Sérgio

26 de novembro de 2012

Começa um novo Ano Litúrgico - Tempo do Advento


O Tempo do Advento é o ponto de partida do Ano Litúrgico: a espera do Messias. Os fiéis se preparam pela conversão para a celebração dessa vinda: “Revestido de nossa fragilidade, ele veio a primeira vez… revestido de sua glória, ele virá uma segunda vez” (Prefácio do Advento I).

Quatro domingos
Como todos os anos, o espírito do Advento é marcado pelo tema do encontro com o Salvador, que veio inaugurar a perspectiva final de nossa História (1º dom.) Celebramos a esperança de sua primeira vinda (2º e 3º), até o despontar de sua presença, na gravidez de Maria, cheia de graça (4º dom.). Nesta meditação, a liturgia evoca a renovação da História pela obra de Deus, citando os nomes novos que receberá Jerusalém – (1º e 3º domingos) e a grandeza que se realizará na pequena cidade de Belém (4º dom). O Advento deste ano revela o cunho “prático” do 3º evangelista, sobretudo no 3º domingo, que diz concretamente em que consiste, para cada classe social, a conversão ao Senhor que vem.

O ano de Lucas
O ano C é o ano de Lucas, evangelista da “manifestação da bondade de Deus e de seu amor pela humanidade”(cf. Tt 3,4), evangelista dos pobres e dos pecadores, dos pagãos e dos valores humanísticos, como também das mulheres, especialmente, de Nossa Senhora. Seu evangelho faz de Jesus não apenas o Messias (Mc), o Mestre (Mt), mas o Fiel, que nos serve de modelo em nossa caminhada, o homem de oração, de ternura humana, de convivência fraterna, mas também o profeta por excelência, o novo Elias, o porta-voz credenciado do Altíssimo. Assim, o ano C será o ano da práxis cristã segundo o modelo de Cristo.

(1) Konings, J., Liturgia Dominical, Vozes, Petrópolis, 2004, p.351
(2) Idem.

22 de novembro de 2012

Reflexão - Caminhar

“As vezes é preciso parar e olhar para longe, para podermos enxergar o que está diante de nós”. John Kennedy

Caminhar exige muitas habilidades, mexe com o corpo e a mente. Só que aprendemos a fazer isso de maneira autômata: não precisamos pensar para dar um passo e mais outro… Porém, fazemos muitos cálculos, medimos distância, avaliamos o chão, ainda que maneira quase inconsciente e impensada. Quando chegamos ao cume de um monte temos a oportunidade de ver e contemplar o caminho e a imensidão que se abre diante de nós!
Assim também na vida: é preciso caminhar, calcular, parar e até dar alguns passos atrás! Quando estamos com o problema de frente ao nosso nariz não conseguimos ver: é preciso dar alguns passos atrás para avaliar melhor. Quem avalia bem o caminho percorrido e aprende com ele, com certeza terá melhores condições de planejar o futuro. Este se faz no presente, no hoje, no momento em que se respira e onde a vida pulsa. Então, siga em frente com o coração valente e muita disposição!

Frei Paulo Sérgio, ofm


21 de novembro de 2012

Casamento e família, prioridade do triênio da OFS.

O Capítulo Ordinário Nacional da OFS, realizado em Brasília de  24 a 26 de agosto de 2012,  determinou que  o tema da família fosse  uma das prioridades do triênio  2012-2015.  Assim lemos no  Documento Final: 


Evangelização da Família :

Tendo em vista as profundas transformações sociais, culturais, religiosas pelas quais passam as famílias, e porque o XIII Capítulo Geral da OFS escolheu como uma de duas prioridades a “família”, queremos priorizar a Evangelização da Família neste triênio.  Estratégias: publicação de temas na revista “Paz e Bem” para estudo e reflexão; elaborar subsídios para os Regionais, para que consagrem um ano de estudos sobre a família, com temas como: Luzes e sombras sobre a família; a construção do casal; o sacramento do matrimônio;  Igreja doméstica; princípios para a educação; viúvos, doentes e casos especiais, uma família franciscana e outros.

Pensamento de abertura
Somos marcados pelo olhar profético que nos lançaram em pequenos, como a maldição ou a bênção  das fadas nos contos infantis. Os dramáticos ou trágicos personagens que inventei em meus romances foram frutos de famílias particularmente doentes onde imperavam o desamor, a hipocrisia e o isolamento. Às vezes eram inibidos pela impossibilidade de manifestar afetos – que murchavam sem serem exercidos. Se viver sozinho já é duro, viver em família pode ser onerado e oneroso. Sofremos com a precariedade dos laços amorosos. Sofremos com a  falta de dinheiro e de tempo. Sofremos com a necessidade de suprir cada vez mais os mandatos do consumo. Sofremos com o pouco espaço para o diálogo, ternura, solidariedade dentro da própria casa. Principalmente não temos tempo ou disponibilidade para o natural exercício da alegria do afeto  (Lya Lutf, in Perdas e Ganhos, Record,  p.25)
1. A família é um assunto “quente” em nossos dias. Apesar de todas as profecias anunciando sua extinção, a experiência mostra que sua sobrevivência está garantida. Ela continua sendo a célula fundamental da sociedade e, no plano da fé, a Igreja doméstica. Realidade viva, ela está sujeita às transformações sociais, históricas, religiosas  e culturais. Xavier Lacroix,  leigo francês,  na Introdução de uma de suas obras sobre o tema, escreve:  “Como vai a família? Sociologicamente falando de maneira muito contrastante. De um lado nossos contemporâneos continuam atribuindo muito valor aos laços familiares: a família é dos primeiros lugares de solidariedade, os laços entre as gerações permanecem, as refeições em torno da mesa permanecem imagens chaves da felicidade. De outro lado, no entanto, os laços se desfazem, frequentes as rupturas conjugais e com elas a ausência dos dois genitores, do pai  e da mãe.  As famílias se dispersam, se decompõem e se recompõem. A família é percebida mais como uma nebulosa de relacionamentos afetivos do que como princípio de estabilidade, de uma forma definida, em uma palavra, uma instituição” (Xavier Lacroix, De la chair et de la parole. Fonder la famille, Bayard, Paris 2007, p. 9). Não se duvida de sua importância.  A questão é sempre esta: como construir um casamento e uma família com sólidos fundamentos? Por aí vai o sentido dessa prioridade da OFS em termos internacionais e em nosso caso da OFS do Brasil. Queremos fortalecer nossas famílias  e  preparar os franciscanos para agirem na pastoral familiar. Temos o desejo de que um bom número de casados ingressem em nossa família secular.

2. Diga-se logo: a OFS não é feita primordialmente para o casal ou para a família. É escola de santidade para todos indistintamente. É sempre, no entanto,  enriquecedor  para os irmãos e para a Fraternidade quando alguns casais ingressam na Ordem. Na busca da santidade franciscana, muitos irmãos e irmãs casados não contam com a ajuda do parceiro(a).  Há mesmo cônjuges que apenas toleram a pertença do outro a um grupo como o da OFS, sem apoiar. Bom seria se marido e mulher pudessem crescer juntos conjugal e franciscanamente.  Normal e urgente que os franciscanos seculares  reflitam sobre as transformações da família para serem casais mais santos e melhores educadores de seus filhos. Os franciscanos, seguidores do Evangelho, haverão de evangelizar o mundo através do testemunho de um casamento belo e simples, feito de alegria e de cores franciscanas. Será de bom alvitre que nossas Fraternidades sejam lugar de encontro dos membros de nossas e de outras famílias.  As reuniões festivas precisarão ter a presença de filhos, netos, parentes. Elas deverão ser espaços onde as famílias  possam se sentir à vontade, como se fosse sua pátria…

3. Quando queremos refletir sobre o tema da família, convém ter diante dos olhos aquilo que a Regra fala a respeito do tema: “Em sua família vivam o espírito franciscano da paz, da fidelidade e de respeito à vida, esforçando-se por fazer dela um sinal de um mundo já renovado em Cristo. Os esposos, em particular, vivendo as graças do matrimônio, testemunhem no mundo, o amor de Cristo por sua Igreja. Mediante  uma educação cristã simples e aberta  de seus filhos, atentos à vocação de cada um, caminhem alegremente com eles em seu itinerário humano e espiritual” ( n. 17).   Precisamos agora nos deter nas luzes e sombras que incidem sobre a realidade do casal e da família.


4. Considerações gerais:  João Paulo II escreveu uma frase que vai atravessando os tempos: “O futuro da humanidade passa pela família”. A família é a primeira célula da sociedade, berço da humanidade, escola de humanismo e Igreja doméstica. Trata-se de um pano de fundo de nossas existências. Nascemos, crescemos no seio de uma família que deixamos  para constituir uma nova família. Realidade em constante transformação, muda de cores como um camaleão. Uma coisa é a família somente com o casal, outra nos primeiros anos de casamento com a chegada dos filhos, com os filhos adolescentes, com os pais (avós) com saúde ou sem saúde,  depois das bodas de ouro de casamento.  Deixamos nossa família, constituímos uma outra. De alguma forma continuamos ligados à família de origem. Entramos em contato também com a família de origem de nosso cônjuge. Um emaranhado de relacionamentos! Família de gente jovem, de idosos, ou  de idosos bem doentes, família que administra os nascimentos  e a morte. Família no batizado dos novos e no sepultamento dos idosos. Espaço onde, as mais das vezes, fazemos nossa primeira experiência de fé e de descoberta de Jesus. Há um momento em que as asas estão fortes e os filhos precisam aprender a voar, a deixar o ninho para darem sua colaboração mais direta na construção do mundo. Somos marcados por nossas  experiências familiares, sejam elas positivas  ou traumáticas.

5. Luzes:  Não podemos canonizar  todos os modelos de família do passado. Nem sempre as pessoas se sentiam amadas e promovidas. Muitas vezes ouvia-se a esta frase: “família é apenas bom para  fotografia”, ou então, “família é uma camisa de força”.
● Sabemos que a mulher nem sempre foi respeitada e colocada em seu devido lugar: hoje vemos mulheres se realizando conjugal, maternalmente e profissionalmente.  Acontecia, por vezes, como que um ditatorialismo por parte do marido, não por má vontade mas porque era assim…  O trabalho profissional da mulher vai colocar outros problemas. A família é menos discriminatória.  Hoje, notamos o homem procurando sua nova identidade no seio do casal e da famílias. As tarefas domésticas são divididas mais equitativamente.  Com as separações, os homens aprendem a ser pais e mães.
●  Hoje, os filhos contam. Antigamente eram colocados no mundo e pronto.  Por vezes, eram educados com muito rigor e corrigidos com surras. Hoje contam demais.  Os pais evitam traumatizá-los, fazem o impossível para que estudem, para que sejam bem-sucedidos. Procura-se respeitar a criança e fazer com que suas riquezas sejam descobertas e levadas em consideração. Talvez demais. Com o medo de traumatizar os filhos, não são preparados para o negativo da vida. São criados molemente.
●  Tem-se a impressão de que a família está em estado de construção. Há mais  conversa no sentido de se discutir a  relação.  Movimentos de espiritualidade conjugal fazem com que casais aprendam a construir a conjugalidade.  A família é hoje, deveria ser hoje, terra de diálogo e de compreensão.  Muitas vezes o é.
●  Pode-se dizer que a tentativa da transmissão da fé aos filhos se faz  com menos imposições e esquemas de  “religiosidade” e  mais na linha de uma proposta que respeita a liberdade. Há famílias que conseguem ser famílias cristãs onde se respira o Evangelho.
●  Num mundo massificado e marcado pela  comunicação mais ou menos impessoal, a  família foi se tornando mais do que nunca um lugar de afetividade.
●  “As famílias de hoje reúnem pessoas de uma individualidade muito marcante  que não concebem o casamento como no passado.  A família nascida  desses casamentos, baseados na autonomia de cada um, na igualdade dos sexos e no equilíbrio entre o que se dá e o que se recebe, é uma família mais frágil, por natureza, mas cujas relações são também mais profundas” (Ser família na Igreja e no mundo,  Equipes de Nossa Senhora,  Vozes, 1993, p. 16).
6. Sombras : Há muitos motivos de preocupações no tocante à família.  Há sombras e regiões obscuras que nos levam a pensar.
●  Resultados de pesquisas  sérias apontam para um grande numero de famílias constituídas apenas pela mãe e o filho (ou os filhos).  Normalmente, a criança só pode nascer quando  um homem e uma mulher se unem a partir de uma profundo bem-querer. Os filhos são fruto desse amor superabundante. Os filhos só podem nascer e crescer sob o olhar do pai e da mãe.
●  Lembramos a questão da “produção independente” e do aborto como grandes sombras.
● Preocupa o fato de que muitos rapazes e moças, na realidade adolescentes, vivam experiências de intimidade sexual muito precocemente desvinculando o verdadeiro amor da prática da sexualidade.
●  Não é normal que os casamentos durem tão  pouco tempo. Há casais que não dão tempo ao  tempo, não esperam brotar as riquezas escondidas no parceiro e na parceira. Imaturamente se unem, imaturamente se separam, imaturamente se recasam.
●  Há ainda muita violência na família: violência física contra os mais fracos, falta de respeito à dignidade do outro, violência até mesmo porque não se educam os filhos e nem lhes é proposta a fé para a esta possam livremente aderir.
●  Devido a diferentes razões,  de modo particular  ao trabalho excessivo dos esposos e estudo e atividades dos filhos, não há presença de vida a vida. Não há encontros regulares entre os membros de uma família. Os contatos se fazem pelo celular e pelo correio eletrônico.  Não se come juntos, não se reza juntos, não se nutre o espírito de família.
● Alguns casais não sabem construir  sua conjugalidade. Vivem  juntos. Aos poucos, porque o amor não foi alimentado, se tornam estranhos uns aos outros.  As relações íntimas são feitas meio eroticamente, espacejadas e não são realmente expressão de um bem-querer que abarque a vida.  Há necessidade de se  cuidar de uma harmonia sexual.
● Os pais não estão preparando  seus filhos para voarem com as próprias asas.  Meninas e rapazes, já homens feitos, exercendo a profissão, mas morando em casa dos pais, mantendo relacionamento com parceiros sem casamento. Os pais “torcem” para que os filhos se casem mais tarde. Há esses homens e mulheres que  passam a viver juntos sem casamento ou com casamento  a partir dos 35 anos e excluem os filhos.
●  Não podemos deixar de mencionar  a delicadíssima situação dos casamentos e da prole em certas camadas mais pobres e sem formação humana. São colocados filhos no mundo e estes vivem ao deus dará.  Numa casa, a mulher reúne filhos de mais de um parceiro. Muitos desses meninos e meninas, bem cedo, entram no mundo da contravenção, do roubo, do crime.  As estatísticas dizem que são assassinados um grande número de rapazes com menos de trinta anos.
●  Vivemos um tempo com uma cultura marcada pelo individualismo, hedonismo, pelo prazer, cultura do provisório, do consumismo.  Toda essa mentalidade é contrária ao casamento e à família. O grande desafio que é colocado diante dos pais é precisamente este: educar para o amor e a solidariedade, para a vida familiar de doação num conjunto de todos esses desvalores.
●  Entre as sombras não podemos deixar de lembrar que os pais, primeiros catequistas dos filhos, têm a mente crivada de  dúvidas e de inseguranças. Acreditam mal. Não conseguem transmitir.  Não sabem o que é uma Igreja doméstica.  A insegurança dos pais na educação e na formação cristã dos filhos é notória.
●  As pessoas vivem “antenadas”. Não querem pensar. Música, celular, internet… agitação interna e externa.  Ninguém visita seu interior. Tudo é feito por fazer, para ganhar dinheiro, para ter lucro, para aproveitar a vida.  As pessoas crescem sem terem adquirido uma certa maturidade.  Tudo é barulho.  Barulho em casa, barulho  nas celebrações, barulho que dopa e  tonteiam as pessoas.  Não podemos nos deixar educar  pela televisão.   Precisamos pensar, discernir, escolher.
Concluindo sem concluir
Eis alguns aspectos da vida do casal e da família com luzes e com sombras. São apenas alguns. Importante ver as coisas com lucidez. A partir de uma visão realista  podemos construir o novo.  Nada de saudosismo, de  querer refazer uma família do passado.  Nada de adotar as fantasias de hoje.  Será preciso  criar o novo e, nós, cristãos, empenhar-nos-emos em  evangelizar a família, sem pieguice: criar o casal, educar de maneira nova,  rever nosso modo de viver a fé, construir uma família franciscana.
Textos para a  reflexão
1. “Antigamente a família corria o perigo de anular a personalidade individual para preservar o bem da entidade familiar. Nos nossos dias, a família enfrenta o perigo do individualismo. Jurídica e economicamente, o indivíduo  é mais privilegiado que a família.  Os meios de comunicação  exaltam o herói solitário. Os valores oferecidos são individuais (criatividade, profissionalismo, etc ) ou então universais (pacifismo, ecologia etc.).  As biografias dos grandes homens raramente mostram, de maneira clara,  que toda realização  pessoal tem seu ponto de partida num fato familiar. Hoje, após termos cantado os louvores do individualismo para  libertar o homem do jugo dos laços sociais, este mesmo homem está arriscado a se ver fechado  numa prisão ainda mais insuportável: a solidão” (Ser família…op.cit, p. 17).
2. “Conheci a educação pelo terror  que imperava antigamente (antes que os conhecimentos de psicologia nos ensinassem a sermos menos cruéis) até em famílias estruturadas e funcionais: Se você  engolir as sementes, essa noite vai nascer uma árvore na sua barriga;  se você mentir seu nariz vai crescer e vem polícia cortar com uma tesoura enorme;  se você comer fruta sem lavar, vai ficar com a barriga cheia de vermes horríveis… Hoje  caímos  no outro extremo. Pais atônitos com a invasão do psicologismo fácil e nem sempre consistente receiam impor limites aos filhos para que não fiquem traumatizados. Pais inseguros ou desinformados levam os filhos aos mais variados especialistas para tratamento nem sempre necessários e  oportunos.  Sei de pais que procuram a emergência de um hospital para que as enfermeiras cortem as unhas de um bebê,  ou meçam a temperatura simplesmente “hoje eu achei ele meio quentinho”  (…).  A psicologia ajuda a entender e aliviar a personalidade. Assim, a escola, a creche, o jardim de infância não são lar nem família, as professoras  não são mães e tias, e não se deveriam incumbir esses terceiros, por mais dignos e respeitáveis que sejam, dos deveres do nosso coração.  Que deveres são esses?  Abrir um espaço de ternura no cotidiano apressado e difícil, eventualmente cruel. Deixar aberta a porta do diálogos não convencionais, com hora marcada, mas no fluxo habitual do interesse e do carinho. Amor em família é uma arte, um malabarismo, por vezes um heroísmo. Essencial como o ar que respirarmos” (  Lya Luft,  Perdas e Ganhos, op.cit,  p. 46-47).

Questões para  círculos de estudo:
 1. O que mais chamou sua atenção no texto?
2. Além das luzes sobre a família acima descritas, o que mais ainda gostariam de destacar como elementos  positivos da família hoje?
3. O que mais preocupa  no elenco das sombras?  Que outras acrescentariam?
4. Espontaneamente procurar mostrar dois ou três caminhos para que a   família  venha a ganhar um novo lugar na  Igreja e no mundo.

Frei Almir Ribeiro Guimarães

Extraído de:  http://www.franciscanos.org.br/

20 de novembro de 2012

Meditações sobre o "Ano da Fé" - A Lumen gentium

 

    Após a introdução sobre o Ano da Fé e suas perspectivas, damos início às meditações a partir dos documentos conciliares, neste período de um ano, para que com mais clareza e profundidade possamos observar os aspectos essenciais que o Concílio nos propusera e continua a nos propor por meio do Magistério. Se por um lado a Constituição é uma leitura do Mistério da Igreja, peregrina neste mundo e esperançosa dos mistérios celestiais que Nosso Senhor há de dar-lhe como recompensa pelos seus méritos; por outro é uma manifestação da Igreja triunfante, que após peregrinar em meio a tormentos e procelas, faz-se agora partícipe da gloria salvífica do Seu Fundador, Cristo Jesus, Rei e Senhor do Cosmos.

 
Assim inicia a Constituição Dogmática Lumen gentium:
“A luz dos povos é Cristo: por isso, este sagrado Concílio, reunido no Espírito Santo, deseja ardentemente iluminar com a Sua luz, que resplandece no rosto da Igreja, todos os homens, anunciando o Evangelho a tcda a criatura (cfr. Mc. 16,15). Mas porque a Igreja, em Cristo, é como que o sacramento, ou sinal, e o instrumento da íntima união com Deus e da unidade de todo o gênero humano, pretende ela, na sequência dos anteriores Concílios, pôr de manifesto com maior insistência, aos fiéis e a todo o mundo, a sua natureza e missão universal. E as condições do nosso tempo tornam ainda mais urgentes este dever da Igreja, para que deste modo os homens todos, hoje mais estreitamente ligados uns aos outros, pelos diversos laços sociais, técnicos e culturais, alcancem também a plena unidade em Cristo” (nº1).
As condições teológicas que se seguiram ao Concílio foram mesmo inquietantes para a realidade pastoral e teológica da Igreja; de fato, muitos não quiseram aceitar o contexto e o viés teológico proporcionado pelo mesmo, que não interrompia em nada o anterior, mas era uma continuidade, suscitado pelo Espírito como Dom à Igreja.

O Bem-aventurado João XXIII no discurso de abertura do Concílio ressalta o objetivo principal deste acontecimento: “O que mais importa ao Concílio Ecumênico é o seguinte: que o depósito sagrado da doutrina cristã seja guardado e ensinado de forma mais eficaz” (Papa João XXIII, Discurso de abertura do Concílio Vaticano II). Assim, não tende a outra finalidade senão continuar, como depósito da sã doutrina, a anunciar a Boa Nova como mandara o seu Senhor e a fazer-se porta-voz do consolo de Cristo nas necessidades hodiernas que impetram temor e tremor aos homens.

Em primeiro lugar, a Constituição enfatiza claramente que o Concílio é fruto da ação do Espírito, não uma ação humana, restrita ao âmbito terreno, mas é dom do alto, é força propulsora que faz os homens recobrarem o valor da misericórdia de Deus e a natureza missionária, pela qual a Igreja foi constituída e que era o tema central daquele momento de graça.  
Uma primeira realidade que encontramos logo de início, é a Igreja anunciadora, missionária, que adentra povos e culturas para lhes indicar o kerigma, a novidade do Evangelho. Para anunciar esta novidade, antes, é preciso que ela mesma resplandeça o Cristo, afinal ninguém pode dar aquilo que ainda não possui. Anunciar o Senhor, e anuncia-lo com alegria sempre nova: eis o ideal cristão! O cristão não pode se tornar suscetível às alegrias e tristezas do mundo, mas, se firmado na verdade, sua alegria é inabalável, sua coragem é imutável, sua determinação é inatingível, sua vida torna-se assim testemunho autêntico do projeto do Reino. E iremos encontrá-la sobretudo na expressiva riqueza dos documentos conciliares, que chamam os fiéis não a uma fé fechada, restrita a seus ideais, uma fé triste pelas dificuldades que acarretam o ser cristão; é sim uma conclamação a alegria de Cristo, a mesma alegria que invadiu as mulheres quando, ao contemplarem o Ressuscitado, foram anunciá-lo aos apóstolos. Naquela madrugada, tomadas pelo medo mas também pela alegria, as mulheres foram pressurosas aos apóstolos anunciar aquilo que o anjo mandara: “Não vos assusteis! Procurais Jesus, o nazareno, aquele que foi crucificado? Ele ressuscitou! Não está aqui! Vede o lugar onde o puseram! Mas ide, dizei a seus discípulos e a Pedro: ‘Ele vai à vossa frente para a Galileia, Lá o vereis, como ele vos disse!’” (Mc 16,6b-7).
E precisamente aqui reside o foco primeiro do Concílio: dar um novo caráter pastoral à Igreja. Não visava condenar heresias ou proclamar dogmas, mas reavaliar, fomentar, ilustrar o novo cenário que se despontava e, nesta perspectiva, aggiornar (atualizar) os ensinamentos eclesiásticos mostrando ao mundo o caráter sempre atual do Evangelho. Ainda nesse aspecto o Papa João XXIII afirmara no discurso de abertura: “Uma coisa é a substância do "depositum fidei", isto é, as verdades contidas na Doutrina da Igreja, e outra é a formulação com que são enunciadas, conservando-lhes, contudo, o mesmo sentido e o mesmo alcance. Será preciso atribuir muita importância a esta forma e, se necessário, insistir com paciência, na sua elaboração; e será necessário usar a maneira de apresentar as coisas que mais corresponda ao magistério, cujo caráter é prevalentemente pastoral”.

Um segundo aspecto é a manifestação da Igreja como Sacramento, emanada do lado aberto de Cristo, representada pelo sangue e pela água que jorraram do seu peito. Da Cruz brota para o mundo a Igreja, fincada no coração do Seu Senhor, ostentada pelo lenho da salvação. E por consequência desta ligação, mesmo com as adversidades constantes, com o cinismo religioso da parte de alguns, com o relativismo, com a descrença, Ela está indissoluvelmente estreitada ao lado de Cristo; desta forma, como nos diz o profeta, ela é receptáculo, beneficiada, por aquelas palavras que nos fazem atentar ao zelo pertinente que os cristãos tiveram nos séculos e que fizeram edificar-se na história: “Haurietis aquas in gaudium... – Haurireis águas com gáudio das fontes do Salvador” (Is 12,3).

O primeiro capítulo, portanto, está dedicado ao Mistério da Igreja e a sua história, desde a prefiguração do Antigo Testamento até a sua presença no contexto histórico-salvífico da humanidade, o qual continuaremos a ver, juntamente com outros documentos, no decorrer deste Ano da Fé.

Na Audiência Geral da Quarta-feira, 14 de Novembro, dando continuidade às suas meditações sobre o Ano da Fé, o Santo Padre Bento XVI, afirmou: "Muitos têm compreensão limitada da fé cristã, porque a identificam como um mero sistema de crença e de valores e não tanto com a verdade de um Deus revelada na história, desejoso de comunicar com o homem face a face, em um relacionamento de amor com Ele". 

Eis aqui o fundamento primeiro: amor! Uma palavra tão desgastada, tanto etimologicamente, quanto sentimentalmente. Transcorridos cinco decênios do Concílio faço insurgir um questionamento: temos sido a religião do amor e do perdão que Cristo tanto anunciou? Temos cumprido a primeira missão do ser cristão que reside convictamente no amor? Questionamentos pertinentes à nossa realidade que convidam-nos a realçarmos o papel primário do amor no âmbito cristão. 

Não desejo fazer uma meditação etimológica, teológica ou filosófica do amor, mas levar a uma realidade sobrepujante: a sua vivência. A realidade do amor é o fundamento do projeto salvífico de Cristo. Deus é o Deus da justiça, do perdão, da misericórdia, mas o é também – e sobretudo! – do amor. O Cristianismo, se esvaziado deste, perde todo o seu sentido, todo o seu significado maior, torna-se apenas um código de moral ou ética, rompe o laço trinitário, desvanece do seu caráter salvífico. Por isso, a Lumen gentium condiciona este caráter a estar arraigada em Cristo (“a Igreja, em Cristo...”), verdadeiro e único Salvador.

E se o amor é plano de fundo da comunhão entre os homens de boa vontade, é propício que também, atado a este, encontre-se outra definição eclesiológica conciliar: “instrumento da íntima união com Deus e da unidade de todo o gênero humano”. De fato, como por nós é sabido, todo instrumento é servido para auxiliar em algo, a alguém. A Igreja, usada pelo próprio Cristo como seu Corpo Místico, ou segundo a expressão paulina, “esposa de Cristo” (Ef 5,22-32), não é dona dos mistérios que lhe foram confiados, mas é uma administradora fiel, prudente e materna, que sapientemente conduz e produz frutos abundantes. Está em todos os lugares e é porta voz de todos os povos. 

Parece-nos que, muitas vezes, temos nos invalidado desta missão de promovermos a unidade; ao contrário, percebemos também que em diversos atos temos sido promotores de discórdias e de lutas, seja com nossos irmãos crentes ou com os que professam outra fé. Cabe a nós fazermos valer este título de promotora da unidade com o gênero humano. Devemos dialogar em comum fitando-nos no mesmo ponto que é Cristo Jesus. Isso não significa aceitarmos os erros teológicos de outrem, mas dialogarmos pela passividade, pelo respeito e pela liberdade, reconhecendo a autonomia religiosa de cada um e fazendo com que o primeiro direito e dom de Deus, a vida, seja defendido em todos os lugares. 

A Igreja também é, antes de tudo, um caráter mistagógico, outrora oculto em Deus, hoje revelado e em parte realizado; é manifestação de Deus aos homens, graça doadora do Pai para que, reconstituindo os laços humanos divididos pelo pecado, pudessem reencontrar um caminho, um farol, para seguirem adiante e não desanimarem no curso histórico.

Sendo mistério de Deus a definimos, por conseguinte, como "mistério humano", ou ainda melhor diríamos: mistério aos homens. Não obstante ser genuinamente e basicamente projeto divino, ela não poderia desenvolver outro curso senão ao lado da história humana. É sabido que dentre as constituições ontológicas do homem, temos algo que lhe é inerente e, portanto, imutável: a sua passividade a errar. Deus, em sua absoluta grandeza, nunca está sujeito ao erro, uma vez que seria contrário à Sua natureza, e assim sendo, isto nos levaria a questionar a veracidade de Sua divindade; no entanto, sendo Deus o supremo arquiteto da graça e baluarte da salvação, doa aos homens a Igreja como propiciadora de uma feliz reconciliação, reatando os laços que, outrora, foram cortados pelo pecado.

Reafirmando a unicidade do homem com Deus e a impossibilidade de uma existência sadia longe d'Ele, o inimigo perversor semeia a intriga e a discórdia, para que seja a Igreja atacada de forma virulenta e possa desanimar de sua missão profética. Como bem alertara o Venerável Servo de Deus, Papa Pio XII, de imperecível memória, e com o qual findo esta primeira meditação: 
“Certamente, o ódio contra Deus e contra os que legitimamente lhe fazem as vezes é o maior crime que o homem pode cometer, criado como foi este à imagem e semelhança de Deus, destinado a gozar da sua amizade perfeita e eterna no céu; visto que pelo ódio a Deus o homem se afasta o mais possível do sumo Bem, sente-se impelido a repelir de si e do seu próximo tudo quanto vem de Deus, tudo quanto une com Deus, tudo quanto conduz a gozar de Deus, ou seja a verdade, a paz e a justiça” (Cart. Enc. Haurietis Aquas, 68). T

 Por Ian Farias. http://www.reflexoesfranciscanas.com.br/2012/11/meditacoes-sobre-o-ano-da-fe-lumen.html

19 de novembro de 2012

Biografia e Carta de Santa Inês à Santa Clara de Assis



SANTA INÊS DE ASSIS


A vida de Santa Inês de Assis, irmã de Santa Clara nos é quase desconhecida... Ela, no entanto, teve um papel relevante na história clariana, aderiu de coração e alma ao carisma de pobreza e sororidade, sendo a primeira vocacionada à vida da Ordem das Clarissas, depois da fundadora, Clara de Assis. Pode, com certeza, ser considerada como cofundadora, por sua dedicada colaboração. Foi quem mais partilhou com Clara o ideal evangélico; é um protótipo autêntico e acabado da Irmã Pobre, um modelo e um exemplo de vida para a clarissa hoje. A Igreja venera-a como santa e sua festa é celebrada no dia 19 de novembro. Talvez algumas notícias históricas, fruto de sérias pesquisas, nos ajudem a conhecê-la melhor. Nasceu em Assis em 1196-1197. Segunda filha de Favarone de Ofreduccio e da Bem-aventurada Ortolana, ambos da nobreza da Úmbria, teve mais uma irmã, chamada Beatriz, também clarissa beatificada, que morreu a 25 de janeiro de 1260 e que teria nascido por volta de 1199. Seu nome de batismo era Catarina (Catherina), como resultado da influência de uma viagem de Ortolana à Terra Santa, passando pelo famoso mosteiro de Santa Catarina de Alexandria, no Monte Sinai, cujos ossos guardados na igreja atraíam peregrinos que desembarcavam no porto egípcio de Damieta e prosseguiam viagem, passando pelo Sinai e posteriormente por Gaza, rumo à terra de Jesus Cristo. Esta mesma devoção inspirou também o nome de muitos mosteiros do início da Ordem de Santa Clara, e era, além disso, um nome muito comum entre as mulheres da época medieval. A infância e adolescência de Catarina foram vividas no palácio da família na praça da catedral de São Rufino, em Assis, com breves estadias de veraneio no castelo de Coresano, no caminho de Gúbio, que pertencia aos cavaleiros nobres de Ofreduccio. Residiu com a família em Perusa como refugiados, num certo período de anos, durante a guerra que se desenrolava em Assis entre o povo em revolta contra o domínio do Imperador e contra os Feudatários. Juntamente com Clara e Beatriz, foi educada santamente pela mãe Ortolana, partilhando dos sentimentos de Clara e desejando, como ela consagrar-se somente a Deus. Clara mesma rezou por sua irmã, suplicando para ela o dom da mesma vocação. Sua personalidade foi se delineando entre as aspirações ao poder e prestígio da nobre família, que se enfileira na guerra a favor dos perusinos contra a cidade natal, e os exemplos de devoção e de virtudes que vê em sua mãezinha e em sua irmã mais velha, Clara. “Com ela vive em concórdia e afinidade de alma” e há entre elas um maravilhoso afeto mútuo que tornará dolorosa a separação, quando Clara deixa a família para seguir o ideal evangélico de Francisco no caminha da altíssima pobreza.
Das Fontes clariana e franciscanas conhecemos como Clara, entre as primícias que oferecia a Deus, com todo os sentimentos do coração, pedia com maior intensidade que aquela concórdia e afinidade de alma que tivera no mundo com a irmã se tornasse agora união de vontade entre elas no serviço de Deus. Reza com insistência ao Pai das misericórdias, e sua oração é atendida. Eis que uma luz inunda o coração de Inês, mostrando-lhe a belíssima realidade de um amor divino livre e soberano que domina em sua jovem vida e torna-se tudo.
Santa Inês de Assis foi a segunda depois de Clara na Ordem das Clarissas, iniciando sua vida consagrada a Deus com apenas catorze anos. Sua fuga de casa ocorreu dezesseis dias depois de Clara ter abandonado a família, e foi encontrá-la na igreja de Santo Ângelo de Panço, nas encostas do Monte Subásio, perto de Assis, onde vivia um pequeno grupo de mulheres numa vida de penitência evangélica, mas sem seguir nenhuma regra. Eram provavelmente chamadas Beguinas. Neste mesmo lugar, os parentes tentaram fazê-la retornar, mas ela resistiu firmemente, com a ajuda da oração de Clara. Este local, na verdade, não tinha a segurança do direito de asilo. Se tiivesse, como o mosteiro de São Paulo das Abadessas, na confluência dos rios Tescio e Chiascio, mais distante de Assis, Abadia de monjas beneditinas, em que Clara estivera anteriormente, e de onde seus parentes desistiram de tirá-la depois que tocou as toalhas do altar, apelando para o direito de asilo, que poderia resultar em excomunhão para quem o violasse, Inês estaria protegida. As duas irmãs seguiam os passos de Cristo na Igreja de Santo Angelo quando se desencadeia o ataque dos parentes que, com violência tentam levar Catarina, enquanto Clara, pondo-se a rezar com lágrimas, implora que seja dada à irmã firmeza de propósito. Repentinamente os cavaleiros, com todos os seus esforços, não conseguem mais levantá-la do solo. O tio Monaldo mesmo, que oprimido pela raiva queria atingi-la com um golpe mortal, tomado de uma dor atroz na mão erguida para golpeá-la, foi constrangido a desistir de uma tal luta e a afastar-se com seus soldados, com amargura pelo insucesso. A Legenda de Santa Clara narra com vivacidade este fato, exaltando a sua convicção firme e a confiança na oração de sua irmã. Depois desta luta, São Francisco cortou pessoalmente os seus cabelos e mudou seu nome Catarina para Inês, recordando a firmeza de opção que lembrava a virgem e mártir romana, Santa Inês, depois que ela, pelo “inocente Cordeiro Jesus Cristo, imolado por nossa salvação, fortemente resistiu e virilmente combateu”. São Francisco mesmo a orientou no caminho do Senhor. Conduziu-as, então, na companhia de Frei Bernardo e Frei Felipe, para o pequeno e pobre mosteiro que reconstruíra alguns anos antes, São Damião, onde logo chegaram outras companheiras, das quais um número significativo seria de bem-aventuradas, tornando São Damião um lugar perfumado de santidade. Aqui, Inês aprende de Clara a afastar da mente todo rumor, para poder aderir unicamente às profundidades do mistério de Deus. Não teme abraçar as penas, as fadigas, as privações da pobreza e acolhe tudo com alegria, na entrega ao Esposo. Seguindo o mesmo caminho da irmã, ama contemplar Cristo Pobre e Crucificado. Recebeu graças grandiosas na contemplação e, numa certa ocasião, Santa Clara a teria visto ser coroada três vezes por um anjo, enquanto permanecia suspensa no ar. Confessando a sua irmã o que se passara, narrou que pensava devotamente na bondade e paciência de Deus, como e quando todos os dias se deixa ofender pelos pecadores. Meditava, condoendo-se e compadecendo-se. Refletia sobre o inefável amor que Jesus tem pelos pecadores e como, por sua salvação, sofreu a Paixão e a Morte. Além disso, meditava sobre as almas do purgatório, que não podem por si mesmas alcançar alívio.
A Crônica dos primeiros vinte e quatro Gerais da Ordem dos Frades Menores conservou uma pequena narrativa biográfica de Santa Inês, descrevendo sua fidelidade e assiduidade à oração. Pela tradição temos presente que possuía uma terna e afetuosa devoção ao Menino Jesus e ao Crucificado. A tradição narra que ficou marcada com um sinal no rosto, devido a um beijo do Menino Jesus. Fazia penitências ásperas, mortificações penosas e jejuns rigorosos. Era de um temperamento dócil, delicado, tranqüilo. Caridosa e terna, era cheia de solicitude pelas irmãs que sofriam. Era prudente e madura, testemunho de constância e fidelidade ao compromisso assumido no albor de sua juventude, no desabrochar de seus verdes anos oferecidos ao Senhor. Em 1221, dez anos depois dos inícios de São Damião, Inês foi enviada a Florença, juntamente com Irmã Giácoma, que também havia ingressado em São Damião. Não se conhece com precisão a data de sua chegada a Monticeli e diversas são as afirmações. Sabemos com certeza que ainda estava em São Damião em 1220, pela exata datação de uma carta do Cardeal Hugolino que, escrevendo a Clara, saúda a irmã, que evidentemente estava ali presente. Irmã Chiara Lúcia Garzônio, clarissa do mosteiro de Santa Inês de Florença, grande estudiosa , é propensa a datar a partida de Inês em torno de 1221, como resulta da Crônica do mesmo mosteiro de Monticeli, redigida em 1649, mas que se baseava em documentos precedentes, posteriormente perdidos, e onde se diz que passando por Florença “Francisco mesmo prometeu enviar Inês de Assis às irmãs florentinas”. Também a Crônica dos XXIV Gerais refere o fato de que Inês “foi mandada pelo bem-aventurado Francisco como abadessa em Florença, onde... com o exemplo da santidade de sua vida e com a sua palavra doce e persuasiva, plena de amor de Deus, fervente no desprezo do mundo, plantou naquele mosteiro, como desejava Santa Clara, a observância da pobreza evangélica”. A confirmação mais segura desta data nos vem dos documentos da fundação do mosteiro de Santa Maria de Santo Apolinário, em Milão, que ocorreu em 1222, para a qual é enviada Irmã Giácoma, explicitamente chamada “companheira de Inês, irmã de Clara”. Esta separação de Clara e das irmãs foi para ela na verdade uma prova muito dura. Assim o expressa numa carta escrita logo depois da chegada a Florença. É a única que se conserva, infelizmente, pois se presume que a correspondência tenha continuado posteriormente. Nesta carta, expõe toda a dor pela qual passa, por estar separada das irmãs que tanto ama e com quem pensou que viveria por toda a sua vida. Entretanto, fala também da alegria que experimentou pelo acolhimento carinhoso das novas irmãs e de como se surpreendeu pelo espírito de obediência e docilidade que demonstram para consigo. Acena brevemente ao fato do Papa ter acedido aos seus pedidos e pede que as irmãs roguem ao Frei Elias que as visite com freqüência para consolá-las no Senhor. Inês e Giácoma chegaram poucos meses antes do Natal de 1221, sendo recebidas pelos Frades Menores, já presentes numa comunidade nas proximidades de Florença, na igreja de Santa Maria em São Galo. Este mosteiro de Monticeli, à margem esquerda do rio Arno, sobre as colinas de Florença, tinha como abadessa, desde 1219 por bula de Honório III, uma jovem irmã clarissa de família nobre, chamada Advegnente de Albizzo de Amadei, e não distava muito da comunidade de Frades Menores. Advegnente, com algumas companheiras (Boaventura, Giovanela, Lucia, Cristina), iniciara uma vida pobre no estilo de São Damião a 25 de março de1218, quando o próprio Francisco de Assis, passando por Florença, consagrou-as na Igreja de Santa Maria, na localidade de São Galo e, em seguida, foram acompanhadas a Monticeli pelo benfeitor dos Frades, Guido de Volto del’Arco e sua esposa Bernardesca, onde deram início oficial à vida clariana. Em Monticeli, a igreja e o mosteiro haviam sido construídos com a aprovação do Cardeal Hugolino e a generosa doação do casal Teresa (Sassa) e Forese Merguilese Belicuzi, que inclusive mandaram fundir um sino, onde deixaram gravada a data e o nome do casal, para perpetuar a memória da doação. A 19 de março de 1217, na presença do Bispo de Florença, Monsenhor Giovani Veletri e do delegado oficial do Cardeal Hugolino, Belinguiero Gerolami, foi ratificado o documento de doação do terreno. Estavam presentes Advegnente e suas companheiras, que já residiam na igreja de Santa Maria do Santo Sepulcro, em Florença, à espera das luzes de Deus e da possibilidade de iniciar a vida pobre e penitente das clarissas, tendo por modelo o mosteiro de São Damião de Assis. A 27 de março de 1219 a fundação fora aprovada oficialmente pelo Papa Honório III, que concedeu também o Privilégio da Pobreza à comunidade nascente. Procuravam aproximar-se em tudo, o mais possível, do ideal evangélico vivido em São Damião de Assis, e tinham na pessoa de Clara uma referência contínua. Através dos Frades Menores eram instruídas e introduzidas no caminho do seguimento de Jesus Cristo em pobreza e humildade. Solicitaram então, a conselho do próprio Francisco e dos Frades, a presença de irmãs do próprio mosteiro de São Damião, que ao menos temporariamente as orientassem no espírito da Ordem. E foi assim que Inês e Giácoma foram enviadas por Clara e Francisco a Florença. Logo ao chegar, em 1221, Inês assumiu os cuidados da comunidade, como abadessa, sendo uma presença discreta e acolhedora, materna, sensível, cultivando em sua irmãs o autêntico espírito da vivência das Irmãs Pobres. Todas lhe prestaram obediência com cortesia e reverência, sendo-lhe dóceis e dedicadas e disso Inês ficou sumamente admirada e edificada.
Em 1222, na primavera (entre março e junho), o Cardeal Hugolino visitou pessoalmente as irmãs e os frades de Florença. Queria que Inês fosse a Milão para realizar outra fundação, mas como estivesse há tão pouco tempo na direção e cuidado das Irmãs, a escolha recaiu sobre Giácoma, que viera com ela de Assis e que tinha bem presente o espírito das Irmãs Pobres. Giácoma partiu para Milão com Fiora e mais duas irmãs de Florença, sendo que o mosteiro ficou concluído em novembro de 1224, junto à igreja de Santa Maria de Santo Apolinário, perto de um canal de águas, lugar de neblinas constantes. Giácoma permaneceu oficialmente como abadessa em Milão até 1228, entretanto seu nome consta no elenco de irmãs até 1236, sendo abadessa nesta época Irmã Belvésia.
Em 1235, na primavera, após a Páscoa, passou por Florença Irmã Iluminata de Assis. Chamava-se Grazia, filha de messer Giovani Renaro de Assis, do mosteiro de São Damião, que havia ingressado depois da partida de Inês. Dirigia-se a Mântua, para auxiliar numa nova fundação, juntamente com Irmã Ana, também de Assis. Frei Leão Perego, ministro provincial da Lombardia, pedira a presença das damianitas em Mântua, numa comunidade de mulheres reunidas em Tieto, numa localidade chamada Miliarino, para seguir a Forma de Vida das Irmãs Pobres. Com a aprovação do Cardeal Hugolino, agora Papa Gregório IX, Clara decidira, então, enviar também Inês a Mântua, com algumas irmãs de São Damião e de Florença. Ainda no ano de 1235 chegaram a Mântua Inês, Iluminata, Ana, Andrea e Madalena. O mosteiro fora adaptado numa antiga construção, com o apoio dos Frades Menores e do benfeitor Zambonino de Rufino, que doou o terreno e, posteriormente, a 17 de março de 1242, após a morte da esposa, renovou sua doação à abadessa do mosteiro já ereto canonicamente, Irmã Iluminata. Irmã Ana de Assis recebeu mais uma missão: partiu de Mântua para Veneza, para dar auxílio a uma comunidade de Clarissas, não se tem certeza se em 1237 ou depois de 1242. E Santa Inês retornou a Florença justamente num período entre estas datas, pelo que resulta das pesquisas. Neste tempo era abadessa em Monticeli novamente Advegnente, que morreria nesta fundação de Florença no ano de 1259, deixando um belíssimo exemplo de santidade e testemunho de vida evangélica e amor à Ordem. As fundações de Veneza, Pádua, Milão e várias outras cidades teriam reclamado a presença de Inês para orientá-las, e houve mesmo quem a tivesse colocado aí, em narrativas bem posteriores. Mas historicamente, até onde podemos hoje chegar através de investigações e pesquisas rigorosamente comprovadas, apenas Florença e Mântua tiveram esse privilégio de ter a orientação da santa irmã de Clara.
Em Monticeli de Florença, Inês conheceu uma jovem chamada Humiliana de Cerdi, que desejou muito ingressar no mosteiro das Clarissas, mas por vontade dos parentes teve de se casar aos 15 anos. Nas enormes dificuldades e sofrimentos, encontrava força nos diálogos com Santa Inês, que se tornou sua orientadora espiritual. Por conselho de Frei Miguel, Humiliana ingressou na Ordem Terceira Franciscana. Levou uma vida santa, teve duas filhas e ficou viúva com menos de vinte anos. Morreu em 1246 e foi a primeira Santa de Florença, da Ordem Franciscana. Somente em 1253, perto da morte de Santa Clara, Inês retorna a Assis. Ali, continua profundamente unida a Advegnente e à comunidade de Florença. Numa situação oportuna, solicita do Papa Inocêncio IV a confirmação do Privilégio da Pobreza para o mosteiro de Florença. Em data de 26 de maio de 1253, de Assis, endereçada ao Cardeal Reinaldo, o Papa confia em proteção solícita a ele mesmo e a seus sucessores o mosteiro de Monticeli, até que a abadessa e as irmãs mantivessem o propósito de nada possuir além de Deus. Através da Crônica dos XXIV Gerais, de 1300, sabemos que Inês morreu em São Damião, a 27 de agosto de 1253, dezesseis dias após a morte de Clara. Tinha cerca de cinqüenta e seis anos de idade. Da legenda de Santa Clara sabemos da promessa que Clara, ao morrer, fez a irmã que lhe estava bem próxima: “Agrada a Deus, irmã caríssima, que eu parta; mas tu, deixa de chorar, porque logo virás ao Senhor atrás de mim e, antes que eu me separe de ti, será concedida pelo Senhor uma grande consolação”. Realmente, poucos dias depois, Inês, chamada às núpcias do Cordeiro, seguiu a irmã Clara na alegria celeste. Na ocasião da morte de Inês, a multidão da cidade de Assis acorreu ao mosteiro, aclamando-a como santa. Ao subirem pela ponte levadiça do mosteiro, houve um acidente, devido ao excesso de peso, em que muitas pessoas ficaram feridas na queda. Entretanto, como primeiro sinal de suas virtudes sobrenaturais e de sua santidade, ao ser invocada, curou milagrosamente seus ferimentos. Assim, confirmou-se para a população a certeza de sua santidade, depois ratificada pela Igreja. Inês foi solenemente canonizada a 15 de abril de 1752, pelo Papa Benedito XIV. Foi sepultada inicialmente na cripta ao lado da capela, no mosteiro de São Damião. Em 1260 seu corpo foi inumado e transportado para junto do túmulo de Santa Clara, na Basílica, dentro dos muros de Assis, quando as Clarissas se transferiram para o novo mosteiro, sob a direção da Bem-aventurada Benedita de Assis, abadessa das Irmãs Pobres. Ali repousa, juntamente com Ortolana e outras irmãs que haviam morrido antes da transferência das primeiras Clarissas para o Protomosteiro de Assis e que foram com ela transportadas para dentro dos muros de Assis. São dezesseis as Clarissas Bem-aventuradas, dentre as primeiras damianitas, além de Santa Clara e de Santa Inês, incluídas Ortolona e Beatriz, como riquíssimo fruto da árvore fecunda que brotou no campo da Igreja, a Ordem das Clarissas. Depois do Oitavo Centenário do nascimento de Santa Clara, olhamos agora para o “primeiro rebento” da Plantinha de Francisco, para aprender dela aquela concórdia e afinidade de alma que tornou-se união de vontade no serviço de Deus, e com ela gozarmos da Cruz de Cristo, colocando-nos também nós na escola de Clara, discípula e pedagoga, candelabro de santidade que refulge diante do tabernáculo de Senhor.

Carta de Santa Inês à Santa Clara de Assis


A sua venerável mãe e senhora em Cristo, distinta e querida senhora dona Clara, e a toda a sua comunidade. Inês, humilde e mínima serva de Cristo, prostrada a seus pés com toda submissão e devoção, deseja-lhes o que de mais doce e precioso se possa desejar no sumo Rei altíssimo.
Como a condição de todos foi feita de tal forma que nunca dá para ficar na mesma situação, quando alguém acha que está na prosperidade, então é que mergulha na adversidade. Por isso deve saber, mãe, que estou na maior tribulação e numa imensa tristeza corporal e espiritual. Estou sofrendo um peso e uma dor fora do comum e quase não consigo falar, por estar separada de você e das outras minhas irmãs, com quem pensei que, neste mundo, ia viver e morrer.
Essa tribulação já começou, mas não sei quando vai acabar. Nunca diminui, só cresce. Surgiu há pouco, mas não vai de jeito nenhum para o ocaso. Está sempre junto de mim, não quer se afastar. Eu achava que a vida e a morte deviam unir na terra as que convivem juntas no céu, que a mesma sepultura ia conter as que são da mesma natureza. Mas, pelo que estou vendo, enganei-me, estou angustiada, estou abandonada, estou atribulada por todos os lados.
Ó minhas ótimas irmãs, tenham pena de mim, por favor, chorem comigo, para não virem a sofrer algo parecido, e vejam que não há dor como a minha. Esta dor me machuca sempre, esta tristeza me tortura, este ardor não pára de queimar, por isso estou cheia de angústias por todo lado e não sei o que fazer. Ajudem-me, por favor, com suas piedosas orações, para que essa tribulação me seja tolerável e leve. Ó dulcíssima mãe e senhora, que posso dizer se já não espero rever corporalmente a vocês, minhas irmãs?
Ah! Se pudesse expressar meus pensamentos como desejo! Ah, se pudesse mostrar para vocês nesta folha a longa dor que espero e está sempre diante de mim! Minha cabeça queima por dentro, crucia-se pelo fogo inextinguível das tribulações. O coração geme lá dentro e os olhos não param de derramar rios de lágrimas. Estou toda cheia de tristeza, já quase toda consumida no espírito. Não acho consolação, por mais que busque. Concebo uma dor atrás da outra quando remôo no coração que já não tenho nenhuma esperança de ver você nem minhas irmãs.
Desta parte não há quem me console de todos os meus queridos, mas por outro lado estou muito consolada e vocês podem se congratular comigo. Pois encontrei a maior concórdia, nenhuma divisão, melhor do que poderia esperar. E todas me receberam com a maior cordialidade e alegria, e me prometeram obediência devotamente, com reverência.
Todas elas se recomendam a Deus, a vocês e à sua comunidade, e eu também lhes recomendo a mim mesma e a elas em tudo e por tudo, para que tenham solícito cuidado de mim e delas como irmãs e filhas suas. Saibam que eu e elas queremos observar todo o tempo de nossa vida inviolavelmente os seus conselhos e preceitos. Além do mais, podem saber que o senhor Papa acedeu em tudo e por tudo ao que eu disse e pedi, de acordo com a sua intenção e a minha, na questão da propriedade.
Peço que roguem ao Frei Elias que se sinta obrigado a me visitar com frequência para me consolar no Senhor.

18 de novembro de 2012

O protagonismo dos Franciscanos na Evangelização no Brasil antes dos jesuítas: a experiência de Laguna

Por Frei Sandro Roberto da Costa, ofm
1. Introdução
Evangelização franciscana no Brasil: uma história ainda a ser contada
Quando o assunto é religiosos no Brasil colônia, os primeiros a serem lembrados são os jesuítas. Tal fato se deve, em grande parte, ao desconhecimento dos fatos históricos envolvendo o Brasil neste período. Os manuais e livros didáticos que tratam do tema repetem, com freqüência, um estereótipo, silenciando sobre o protagonismo dos franciscanos e outros religiosos, exaltando a atuação dos jesuítas. Os padres de Santo Inácio de fato marcaram a história do Brasil, não apenas na área religiosa, mas também  política, econômica, e, principalmente, no campo educacional, nos mais de duzentos anos de presença no país, até a expulsão pelo Marquês de Pombal, em 1759. Os jesuítas, pela potência que eram, se impuseram enquanto presença nos maiores centros, com homens preparados intelectual e espiritualmente, enviando para o Brasil seus melhores quadros. Sua expulsão abre uma imensa lacuna no campo da educação, na assistência religiosa, no trabalho com os índios, lacuna que nenhuma instituição religiosa presente no Brasil estava em condições de preencher.

Apesar da importância da atuação dos jesuítas, não se pode negar o papel de protagonistas desempenhado também
pelos franciscanos na história da evangelização do Brasil. Basta recordar o fato histórico de que os franciscanos foram os primeiros religiosos europeus a colocar os pés em terras brasileiras. A primeira missa celebrada no Brasil foi oficiada por um franciscano, frei Henrique de Coimbra, que veio na esquadra de Pedro Álvares Cabral, aportando nas “Terras de Santa Cruz”, em abril de 1500. Os primeiros jesuítas chegariam quase cinqüenta anos depois.
Embora os jesuítas tenham sido os primeiros religiosos oficialmente enviados para trabalhar no Brasil, em 1549, os franciscanos estão presentes e atuantes já bem antes disso, numa presença extra-oficial, esporádica e esparsa, mas não menos rica, evangélica e frutuosa. Temos relatos de vários frades presentes no litoral, de 1503 até 1584. Tendo escapado de algum naufrágio, ou numa escala da viagem, dirigindo-se para a região do Rio da Prata ou para a Ásia, os religiosos franciscanos aproveitavam para evangelizar os indígenas e colonos, nas aldeias e vilas por onde passavam. O primeiro grupo de franciscanos oficialmente enviados pela coroa portuguesa vai desembarcar no Brasil em 1584.
Os missionários jesuítas tinham por obrigação escrever as crônicas e relatos de suas atividades na missão, que eram periodicamente, enviados a Portugal e Roma. Por isso estamos relativamente bem informados sobre sua atuação nos 210 anos de presença na colônia portuguesa. Os franciscanos, ao contrário, não tinham o hábito de escrever sobre suas atividades, ao menos no Brasil.  O raro material que se conserva nos arquivos foram produzidos pelas autoridades, como provinciais, guardiães e definidores. Mesmo assim, alguma coisa se conserva, principalmente nos arquivos europeus. Como verdadeiras jóias preciosas, estes relatos transmitem para a posteridade pequenos restos de memória da história da evangelização franciscana no Brasil. Através deles é possível, mesmo que fragmentariamente, reconstituir parte desta história.

2. A carta de frei Bernardo de Armenta
Nesta exposição vamos estudar um documento que nos relata um momento importante da história da evangelização do Brasil. Através dele poderemos conhecer o espírito que animava os missionários franciscanos que se dirigiam para aquelas terras há pouco descobertas. Ao mesmo tempo, a análise do documento pode nos ajudar a conhecer o método desenvolvido por esses missionários, seus projetos, suas opções, seus sonhos. O documento em questão já foi objeto de análise de alguns estudiosos, nos seus elementos filológicos, históricos, cronológicos, etc. Não vou entrar em “questões disputadas” específicas das ciências históricas. Escolhi este documento como objeto de estudo porque acredito tratar-se de um testemunho histórico coerente, fidedigno e autorizado de um modo específico de evangelizar, concretizado no século XVI pelos franciscanos no Brasil. Acredito que a análise deste documento e do contexto onde foi gerado, podem iluminar o presente de nossa atuação missionária e evangelizadora.
Para situar este documento no seu contexto histórico, político, religioso, inicio com uma breve introdução sobre a realidade do Brasil, nos primeiros 50 anos da chegada dos portugueses, passando a seguir à análise do documento.

2.1 Os primeiros anos do Brasil português 
A chegada de Pedro Álvares Cabral ao Brasil, e os relatos que os pioneiros fizeram sobre as novas terras descobertas, não despertaram maiores interesses de Portugal. A principal preocupação era saber se nas terras descobertas existia ouro. Como as primeiras explorações resultaram negativas, não houve nenhuma preocupação em ocupar as terras. Apenas aventureiros, piratas, náufragos, traficantes de índios, vez por outra aportavam nas costas do Brasil. Foram fundadas algumas “feitorias”, postos em lugares estratégicos, cujo único comércio consistia na exploração das riquezas naturais, peles de animais, e principalmente o pau de tinta “vermelha como brasa”, denominado por isso pau-brasil. Também eram mandados ao Brasil os condenados pela justiça, “degredados” que eram deixados na praia para serem devorados pelos índios ou morrerem à mingua. Somente a partir de 1520 Portugal começa a se interessar pelas terras, na esperança de conseguir meios para diminuir suas dificuldades financeiras. Em 1526 alguns navios franceses são afundados no litoral da Bahia. Piratas e corsários ingleses, franceses e holandeses infestam as costas do país. Portugal decide então ocupa-lo mais sistematicamente. Em 1532 é fundada a primeira cidade, S. Vicente, no litoral sul, de onde saíram as expedições que, em 1551, unindo índios, colonos e jesuítas, iriam fundar a cidade de São Paulo.

2.2 O documento
A primeira experiência mais organizada de evangelização franciscana de que temos notícia no Brasil deu-se entre 1538 e 1548, no litoral de Santa Catarina, na localidade denominada Laguna (Mbiaça), entre os índios carijós.
Em 1537 zarpava da Espanha em direção ao Paraguai a frota de Alonso Cabrera. Cinco frades franciscanos faziam parte da expedição: frei Bernardo de Armenta (de Córdoba, Espanha), superior do grupo, frei Alonso Lebrón (das Ilhas Canárias) e outros três frades dos quais não conhecemos os nomes. A expedição, após várias tentativas, não conseguindo entrar pelo Rio da Prata, foi parar nas costas do litoral catarinense, “ao porto ou rio de São Francisco, anteriormente chamado de D. Rodrigo”, na atual cidade de Laguna, no Estado de Santa Catarina.(1) Alguns meses depois da chegada, a 1o. de maio de 1538, o chefe da missão, frei Bernardo de Armenta, escrevia a João Bernal Dias de Lugo, do Conselho das Índias Espanholas, descrevendo os fatos que os levaram até ali, e relatando o trabalho missionário iniciado. Uma cópia da carta foi enviada a Sevilha. Dali seguiu ao México, onde frei Toribio Motolinia fez uma cópia, e enviou o original de volta à Espanha. Frei Jerônimo de Mendieta a incluiu no Livro IV da sua “História Eclesiástica Indiana”.(2)
Frei Bernardo escreve entusiasmado com o sucesso da missão improvisada. Esta fora obra da providência. Um índio de nome Etiguara, uns quatro anos antes profetizara a vinda de verdadeiros cristãos, “irmãos dos discípulos do Apóstolo São Tomé, e haveriam de batizar a todos”. Frei Bernardo, a quem os índios começavam a chamar de “Payçumé” (São Tomé), escreve pedindo também mais frades para trabalhar com os índios, pois previa que teriam muitos frutos. O frade diz que deu à sua “Província” o nome de “Província de Jesus”.
Em julho de 1538 três dos cinco frades seguem para Buenos Aires com Alonso Cabrera. Fr. Bernardo e frei Alonso Lebrón se recusam a acompanhá-lo. Em Laguna os dois frades fundam um “recolhimento” para as mulheres e outro para os homens, onde é ensinada a doutrina cristã, ao mesmo tempo em que percorrem as aldeias vizinhas.
Em resposta à carta do frade, o rei da Espanha escrevia em 8 de novembro de 1539 ao Ministro Provincial da Província da Andaluzia, mandando que fossem enviados, “para o Rio da Prata seis religiosos seus, a fim de se associarem a frei Bernardo de Armenta, vigário provincial, que reside naquela província da Prata”. A nau foi enviada, chefiada por Alvar Nuñes Cabeza de Vaca, um dos mais ilustres exploradores daqueles tempos, mas não trouxe nenhum frade, a não ser seis ou nove clérigos.(3)

3. Os frades e Cabeza de Vaca
Quando os frades chegaram ao litoral catarinense, Alonso Cabrera, capitão da expedição que os levou, quis obrigá-los a seguir com ele para o interior do território espanhol (Buenos Aires). Frei Bernardo se negou, argumentando que “… não a tendes sobre mim, nem sobre os frades que vão comigo, (mando e jurisdição), pois nem a Sua Majestade nos enviou nem fomos socorridos, na sede, com água da fazenda do Rei, pois os trouxe com o nosso próprio trabalho e suor. Ninguém pode me impedir de pôr a bandeira de nossa santa fé onde Deus manda [...]”.(4)
Quando Cabeça de Vaca chegou em Santa Catarina, em março de 1541, faziam aproximadamente três anos que os frades estavam trabalhando entre os índios. O conquistador exigiu que os frades o acompanhassem na expedição até o Paraguai. A alegação é de que, pela autoridade que os frades gozavam  junto aos  índios, eram indispensáveis para a jornada. Frei Bernardo de Armenta de fato era muito respeitado pelos nativos.(5)Praticamente obrigados pelo conquistador, os dois partem à frente de uma centena de índios, recebendo dele a promessa de que os deixaria voltar assim que chegassem ao destino.(6)
Discussões e desavenças entre Cabeça de Vaca e os frades marcam a viagem. O principal motivo era o tratamento dispensado pelos espanhóis aos índios. Frades e índios, inconformados com a situação, tentam fugir ainda durante a viagem, mas, encontrados, são obrigados a se juntar à expedição, que segue até Assunção. Também lá frei Bernardo e frei Alonso iniciam um trabalho de catequese contra a vontade de Cabeça de Vaca, pois segundo ele “onde não há ouro nem prata, não há necessidade de batismo”. Em  Assunção, fr. Bernardo funda um “recolhimento”, espécie de “casa de doutrina”, onde recolhe umas trinta ou quarenta moças, indígenas, filhas de carijós, para preservá-las da cobiça dos soldados. Cabeça de Vaca e seus soldados protestaram duramente, e fizeram sérias acusações ao comportamento dos frades – entre outras a de que “guardariam encerradas em sua casa mais de trinta índias dos doze aos vinte anos de idade”.
Em fevereiro de 1543 os dois frades tentam fugir de Assunção, desta vez levando cartas dos adversários de Cabeça de Vaca, denunciando-o às autoridades espanholas. Acabam sendo presos, junto com Alonso Cabrera, considerado chefe da conspiração. Finalmente, em 1544, por causa dos contínuos desmandos, Cabeça de Vaca é preso e destituído de suas funções. Provavelmente frei Bernardo tenha tido um papel importante nas acusações contra o explorador, pois era considerado seu principal desafeto. Os frades puderam voltar a Santa Catarina, onde chegaram em 1545. Várias índias do “recolhimento” de Assunção os seguiram.

4. Fim da Missão de Mbiaça
Frei Bernardo faleceu entre 1546 e 1547. Frei Alonso continuou na missão até 1548, quando salteadores portugueses, em dois navios liderados por Pascoal Fernandes, de São Vicente, e Martin Vaz, de Ilhéus, invadiram a missão, prenderam e escravizaram os índios, e levaram prisioneiros os espanhóis e o frade. Quem nos informa sobre todo o acontecido é o jesuíta Manuel da Nóbrega, que escreveu dois anos após os fatos. Segundo ele, os salteadores, chegando ao litoral catarinense, convidaram índios e espanhóis para uma festa no navio, onde prenderam a todos, inclusive frei Alonso. Os índios que ficaram na praia foram ao navio, implorando que soltassem o frade, e levassem os índios presos. Como os portugueses se negassem, os índios disseram que também eles queriam ir com o frade. Assim todos foram aprisionados. Os índios foram desembarcados em São Vicente e Ilhéus, onde foram vendidos.(7) Logo se levantou o protesto dos jesuítas e do próprio frei Alonso Lebrón, que se apresentou diante das autoridades portuguesas defendendo-os, pois não poderiam ser escravizados, já que eram cristãos, e não foram aprisionados em “guerra justa” (não estavam combatendo portugueses). Depois de muito insistir junto ao governador, Nóbrega conseguiu que alguns índios fossem libertados, e, guiados pelo jesuíta irmão Leonardo Nunes, voltassem à sua aldeia, em Laguna. Os protestos dos colonos que tinham comprado os índios dificultaram a empreitada. Finalmente, o Padre José de Anchieta relata que uma doença súbita “matou quase todos”. Frei Alonso Lebrón, vendo que pouco conseguia junto às autoridades no Brasil, viajou para a Espanha, para apresentar suas queixas à Coroa. Acabou desaparecendo, segundo alguns cronistas, prisioneiro nas mãos de piratas franceses. Os carijós catequizados que permaneceram em Laguna continuaram sofrendo os ataques dos caçadores de escravos, e, aos poucos, foram sendo assimilados pela cultura portuguesa, que avançava rumo à costa sul do Brasil.

5. Memória da atuação dos frades franciscanos na Igreja do Brasil
A atuação dos dois frades não ficou legada ao esquecimento. Além da carta preservada na obra do grande Mendieta, padres jesuítas portugueses, trabalhando no Brasil, cuidaram de preservar para a posteridade o trabalho quase anônimo destes filhos de São Francisco em terras tupiniquins. O já citado Pe. Manoel da Nóbrega, em carta de agosto de 1549, referindo-se aos índios carijós, faz menção ao trabalho dos frades: “Este é um gentio melhor do que nenhum desta costa, os quais foram, não há muitos anos, dois frades castelhanos ensinar e tomaram tão bem sua doutrina, que têm já casas de recolhimento para mulheres, como de freiras, e outras de homens, como de frades. E isto durou muito tempo, até que o diabo levou lá uma nau de salteadores e cativaram muitos deles” (8) O Pe. Antônio Rodrigues faz uma referência à aldeia, que os frades “chamaram de Província de Jesus, onde fizeram admirável fruto”. O beato José de Anchieta, referindo-se aos carijós aprisionados ilegalmente em São Vicente, diz que eles são “propensos às coisas divinas”.(9)

6. Comentários de alguns aspectos da carta relacionados à evangelização
À primeira vista o trabalho dos frades consiste na doutrina e no batismo dos índios. Uma análise mais atenta do documento, porém, nos permite perceber, quase nas entrelinhas, uma realidade mais complexa. Além do mais, para uma melhor compreensão desta realidade recorremos a outros testemunhos contemporâneos à atuação dos frades em Santa Catarina, que nos fornecem preciosas informações sobre o modo de pensar dos frades, seu plano de atuação e o modo franciscano de evangelizar.

6.1 Preocupação com o preparo (qualidade) dos evangelizadores
Frei Bernardo, diante do vasto campo que se abre para o anúncio da boa-nova,  vendo a boa índole dos indígenas, sua docilidade em aceitar o batismo, percebe a urgente necessidade de mais frades para colaborar na missão. Na carta ele deixa bem claro a preocupação de que os frades a serem enviados sejam da melhor qualidade: “…que V. Mrd. tome esta empresa por suya, y hable a S. M. y a esos señores del Consejo, para que favorezcan tan santa obra, y el favor ha de ser que nos envíen una docena de frailes de nuestra orden de S. Francisco, que sean escogidos,…”, e termina: “que envíen frailes que sean como apóstoles…”. O modelo que inspira o frade no trabalho evangelizador é a experiência da Igreja primitiva. O  número de frades pedidos, na nossa opinião, não é aleatório nem casual: ele pede que sejam  escolhidos, e que sejam 12. E diz explícitamente: “que sejam como os apóstolos”. Ora, qual era o modo de vida dos apóstolos? Aqui podemos ver uma relação com a experiência evangelizadora dos franciscanos no México: o envio dos primeiros frades àquela região recém conquistada (os “12 apóstolos”), e a tentativa da conquista pacífica, como aparece na “Instrução do Ministro Geral Francisco de los Angeles Quiñones a Martín de Valência, integrante e custódio dos Doze Franciscanos enviados para evangelizar os habitantes de Tenochtitlan [México] conquistado”, de 4 de outubro de 1523. Além disso, frei Bernardo certamente tinha conhecimento de experiências similares que haviam sido tentadas em outras partes da América, não só no México, mas também em Cumaná (1514), nas costas da atual Venezuela.(10) A experiência havia mostrado aos missionários que onde o Evangelho chegava junto com a espada, com a sede do ouro e a ambição do lucro, o anúncio não atingia seus objetivos.
Frei Bernardo se refere aos “maus cristãos”: “la mala vida y mal ejemplo de los que acá viniesen por conquistadores, les harían menospreciar nuestra fe”. A conquista verdadeira é a “espiritual”, aquela que se dá através do convívio, da partilha de vida, da presença solidária e fraterna. Pregação, catequese e anúncio, seriam muito mais eficientes se ancorados no exemplo de vida dos religiosos. E esse foi o método assumido pelos frades entre os índios carijós. Para pregar, anunciar e convencer não basta o preparo intelectual, mas são necessárias  pessoas que se destaquem pelo exemplo de vida. Pessoas cuja vida seja reflexo e espelho das verdades que estão pregando. Tudo isso pode ser resumido na expressão “testemunho”. Somente frades que “fossem como “apóstolos” entrariam nesta categoria. Ora, o modelo de pregação dos apóstolos é o da itinerância, do serviço desinteressado pelo Reino, do anúncio da misericórdia e do amor de Deus, capazes de ir até as últimas consequências em defesa do rebanho, como Jesus Cristo. Esse foi o modelo asumido por Francisco de Assis e seus seguidores. Os frades, pela situação em que se encontravam, viviam, necessariamente a itinerância. Sem dúvida a pobreza e a austeridade de vida eram realidades onipresentes na vida destes missionários. A preocupação dos dois frades em ter bons evangelizadores é uma das caracteristicas deste período de evangelização na América. Com raras exceções, os primeiros a serem mandados eram pessoas muito bem preparadas, moral, espiritual e intelectualmente.

6.2 Preocupação com o “social”
Hoje, quando falamos de evangelização, não podemos desvinculá-la de um envolvimento mais amplo com a realidade social. O anúncio, se é eficaz, transforma toda a realidade. Na carta frei Bernardo demonstra uma clara preocupação que poderíamos denominar de “civilizatória”. A preocupação do frade em conseguir bons evangelizadores é seguida da preocupação em conseguir bons trabalhadores e profissionais, bem como ter instrumentos necessários para a transformação da realidade. O anúncio da Boa Nova é concomitante à preocupação com a transformação nas condições materiais dos indígenas: “…que S. M. envíe un factor suyo que traiga labradores, que no son menester conquistadores… Vengan labradores y traigan  mucho hierro, y algún lienzo y ropa, y ganado de vacas y ovejas burdas, y cañas de azúcar, y maestros para hacer ingenios de azúcar, y algodón y trigo y cebada, y toda manera de pepitas, que se darán bien, y sarmientos, que se harán muy grandes viñas…”. Os franciscanos em toda a América Latina, na sua atuação missionária, por onde passaram deixaram sua marca, não só no anúncio e pregação, mas através de uma preocupação com a qualidade de vida do povo. No Brasil muitos fundaram cidades, construíram hospitais e escolas, ensinaram o povo a cultivar a terra. Pelo que transparece na carta de frei Bernardo, os frades estavam preocupados com uma atuação integral: salvar a alma, cuidar do espírito, mas também cuidar do corpo, da vida neste mundo. A preocupação não é apenas religiosa: é civilizatória, é “social”, como diríamos hoje. Se o pedido de frei Bernardo fosse atendido teria se concretizado no sul do Brasil, guardadas as devidas proporções, a experiência que depois foi realizada por frei Luis de Bolãnos, no Paraguai, a partir de 1580.

6.3 Denúncia e atuação profética
A evangelização, quando assumida por amor ao Reino e ao próximo, necessariamente assume contornos de denúncia social. Frei Bernardo não tem receio de denunciar os pecados do sistema colonizador e da conquista pelas armas. Ele mesmo afirma que “no son menester conquistadores… Y crea V. Mrd. que la mala vida y mal ejemplo de los que acá viniesen por conquistadores, les harían menospreciar nuestra fe. Porque viendo que yo les hago guardar la ley de Dios a la letra, y la guardan con tanta voluntad, si viesen lo contrario en los que acá viniesen, dirían que éramos burladores, pues que a ellos les mandábamos que guardasen la ley de Dios, y los cristianos viejos la quebrantaban”. A história da evangelização na América Latina está cheia de exemplos deste aberto conflito entre os projetos de evangelização e o projeto colonizador.
Esta realidade vai se tornar crítica com a chegada de Cabeça de Vaca. Este trouxe, na sua expedição, 400 soldados “bien aderezados”, isto é, preparados para o combate, para a guerra. Os soldados chegam armados com arcabuzes (260 arcabuzeiros), lanças, bestas, espadas, escudos, além das armaduras e dos cavalos, em número de trinta. Podemos imaginar a reação dos indígenas ao ver todo esse aparato chegando em suas terras. É sem dúvida uma demonstração de força, de poder, e incute temor.
A atuação dos dois frades vai em sentido oposto à atuação de Cabeça de Vaca e dos soldados. Além da demonstração de força bruta, sabemos, através de outros relatos o quanto era comum os soldados abusarem das índias, mesmo porque nas campanhas de conquista não participavam mulheres européias. A situação se mostrava mais crítica porque, enquanto os frades buscavam educar os índios dentro dos parâmetros da moral sexual cristã, a vida dos soldados e colonos, em geral, ia em sentido oposto a estes ensinamentos.
Frei Bernardo, numa outra carta dirigida às autoridades espanholas vai denunciar a prática de escravizar índios e índias. Por isso a saída encontrada pelos missionários, a criação dos “recolhimentos”, em Santa Catarina e em Assunção, é uma atuação clara de defesa do índio, contra os interesses dos conquistadores. Este viam nos índios pessoas a serem exploradas, subjugadas, principalmente as mulheres. Segundo o cronista Juan de Araoz, no auge da desavença de Cabeça de Vaca com os frades, este vai exigir deles que “não se carregassem de tantas mulheres”.(11)Outro cronista, Pedro Fuentes, escrevendo sobre os vícios dos habitantes de Assunção, exatamente à época de Cabeça de Vaca, diz que “há uns que têm dez índias, outros, 30, e alguns, 50, e todos as têm como mulheres…”.(12) Na sociedade hispano-guarani, o que valiam eram “as mulheres, o ferro e as miçangas. Com as índias – quanto mais, melhor -, o sustento estava garantido, pois eram elas as que plantavam, processavam os alimentos e realizavam quase todas as tarefas necessárias para sobreviver naquela terra bruta”.(13) Entende-se a partir deste comentário o cuidado dos frades em proteger as índias em “recolhimentos”, e o motivo de serem eles objeto da ira dos soldados e colonos.
A tentativa de fuga dos dois frades e dos índios, mostra um esforço de resistência aos planos do conquistador. O fato de alguns historiadores verem nos dois frades os “principais opositores de Cabeça de Vaca” (Van der Vat) reforça sua atuação de resistência. A resistência, como vimos, continua mesmo depois da destruição da missão, quando frei Alonso Lebrón busca de todos os modos denunciar os crimes dos portugueses diante das autoridades. Também neste particular os frades de Laguna estão inseridos na tradição da Ordem, de assumir, com todos os meios a seu dispor, a defesa dos índios contra as injustiças. Não podemos citá-los aqui, mas recordamos os inúmeros casos de frades, em toda a América, que se envolveram de corpo e alma nas polêmicas do período colonial, denunciando as realidades iníquas que agrediam a dignidade do índio.

6.4 Missão como colocar-se em relação
Na carta de frei Bernardo transparece uma pura e quase ingênua confiança no trabalho de evangelização. Seu otimismo e entusiasmo dão provas de como o missionário estava convencido do trabalho a ser realizado. Este ardor missionário nasce primeiro de uma vivência do Evangelho. O testemunho de vida é a primeira forma de anúncio. Pelos termos da carta, se percebe que o coração de frei Bernardo ardia pelo amor das almas a serem salvas. “Y con estos indios se ha de hacer muy mejor que con otros de otras partes, pues ellos con tanta voluntad se subjetan al yugo de nuestra santa fe católica… Y confío en Nuestro Señor que cuando ésta llegue allí, tendremos más de ochenta leguas convertidas a nuestra santa fe. Así que, no deje V. Mrd. y esos señores que se pierda tanto bien, porque no se lo demande Dios el día del Juicio, si no socorriesen a tan santa obra…. Pues tal tierra como ésta, no es razón de la dejar, demás de lo principal que hay en ella, que son muchas ánimas.”
A atuação franciscana em Laguna foi, antes de tudo, de “presença”. Foi uma presença silenciosa, efêmera, que não deixou grandes escritos, crônicas ou relatos, mas que se fixou no coração dos habitantes. Recordamos que a carta ao Conselheiro foi escrita apenas alguns meses após a chegada à localidade. Mesmo assim a missiva exala uma simpatia pela cultura indígena e um grande otimismo em relação à missão: “Y lo que más es de alabar a Nuestro Señor, que los más viejos (que hay hombres de cien años) vienen con más fervor. Y no sólo esto, mas ellos mismos predican públicamente la fe católica. Son tan grandes maravillas las que Nuestro Señor obra en ellos, que no las sabría decir, ni bastaría papel para las escrebir….”.
Além do otimismo, o religioso não deixa de ressaltar os aspectos positivos daquela cultura: a riqueza da terra, (“que no tiene que ver Santo Domingo con la bondad de esta tierra”), a variedade de plantas, frutas e animais (“…donde hallarán los que vinieren muchas gallinas y pescados excelentes, y muchos puercos jabalíes y venados, y muchas perdices…”), a saúde, longevidade e força dos indígenas (“que se cansan de vivir los hombres…”), sua natural bondade, (“Y con estos indios se ha de hacer muy mejor que con otros de otras partes…”).
O fato de que Cabeça de Vaca exigisse que os frades o acompanhassem na viagem ao Paraguai é sintomático. Ele logo percebeu a autoridade moral dos frades perante os indígenas. E percebeu que a presença deles na expedição seria uma valiosa ajuda. Numa outra carta, relembrando estes fatos, frei Bernardo comenta que, após uma consulta de Cabeça de Vaca sobre a viagem, “todos concordaram que deveria ser feita a entrada por terra, e que isso fosse com a minha pessoa e a de meu companheiro, pela grande credibilidade que tínhamos com os índios…”.(14) Esta também foi a opinião do comandante Pedro Dorantes. Quando se preparavam para a viagem, este pediu aos frades que os acompanhassem: “Disse-lhe também que ajudaria muito a nossa boa viagem que o comissário (frei Bernardo) fosse com o governador (Cabeça de Vaca), porque os índios do campo o queriam muito… Encarreguei ao comissário essa questão e ele, vendo que isso convinha, concordou… E tenho certeza que Deus fez que não nos desentendêssemos com os índios graças a ele e a um índio que se chama Miguel…”.(15) As crônicas dos viajantes que participaram da expedição relatam as imensas dificuldades da viagem que teve início no litoral brasileiro e terminou em Assunção. Depois de três semanas de viagem, acabaram-se os mantimentos. Cabeça de Vaca queria consegui-los à força dos índios.(16) Acabou sendo convencido a incumbir frei Bernardo de conseguir os víveres entre os nativos da região, coisa que este conseguiu sem dar um único tiro. Sobre os mantimentos conseguidos no caminho, Dorantes relata, discorrendo sobre o papel de frei Bernardo: “Preferiam dar a ele e não vendê-los para nós”.(17)
O respeito e autoridade de que o frade gozava não vinha do uso da força, do poder das armas, do ser superior ou da coerção. Vinham do testemunho de vida, do bom exemplo, da presença fraterna e humilde dos frades vivendo no meio dos índios, com eles e como eles. Tal afirmação é confirmada por vários testemunhos de autores contemporâneos e testemunhas oculares dos fatos. A autoridade dos frades diante dos índios é colocada à prova quando estes têm que assumir uma clara posição de defesa dos índios, contra Cabeça de Vaca. O cronista Juan de Araoz, escrevendo em 1541, relata que Cabeça de Vaca não estava satisfeito com os frades, pela amizade destes com os índios “inúteis, a quem davam de comer”.(18) Esta expressão lacônica revela uma diferença fundamental entre o modo dos frades e do conquistador se relacionarem com os índios. Enquanto o frade se preocupa com o sustento do nativo, o conquistador os considera inúteis, mesmo sendo aqueles índios os responsáveis pelo carregamento das cargas da expedição. Pedro Dorantes relata ainda o cuidado de frei Bernardo com os doentes: “Houve ocasiões em que convinha ao padre comissário ficar para traz com os enfermos, dando-lhes de comer das coisas que [os índios] lhe traziam de esmola”.(19)
A questão que se coloca não é apenas quanto ao “estar presente”, mas o “como” ser presença: uma presença que não se impõe, que não agride, que não extirpa os valores culturais, mas reconhece  seus valores, e é capaz de se “inculturar”. Pelos vários testemunhos já citados, percebemos que os frades estavam muito próximos aos índios. A presença é transformadora pelo próprio testemunho de vida dos frades. Podemos dizer que é uma “presença minorítica”, fazendo-se um deles, sem deixar de propagar os valores cristãos em que acreditavam. Diante de uma realidade totalmente diferente da sua própria, os frades demonstram uma “abertura possível”. Embora levando consigo todo o aparato ocidental-cristão, típico de missionários que iam “converter os infiéis”, que iam salvá-los da idolatria e do demônio, os frades, no pouco tempo de trabalho, entraram em diálogo com a cultura carijó. A questão da alteridade, do perceber e aceitar os valores do outro, do diferente, é um dos mais importantes elementos a serem levados em consideração numa atuação missionária. O comportamento dos frades em Laguna é bem diverso de muitos missionários posteriores (inclusive no Brasil), que vão ver, na cultura a ser evangelizada, apenas erros a serem extirpados e defeitos a serem corrigidos.   

7. Algumas questões abertas
Uma das acusações que se faz ao trabalho missionário no Brasil, a todas as instituições religiosas, é a superficialidade na catequese. Oswald de Andrade chega a afirmar que “nunca fomos catequizados”. De fato, se acreditarmos nos relatos de frei Bernardo, com centenas de batizados a cada dia, pode-se colocar em dúvida a profundidade da catequese. Porém precisamos proceder com cautela. Tal prática não era tão incomum na época. Frei Pedro de Gante fala em 14 mil batizados por dia nos inícios da evangelização no  México. Na mesma área, Motolinía, fala de cinco milhões de batizados em 12 anos, entre 1524 e 1536. A questão é que o batismo não era o ponto final da catequese. Sem dúvida a grande preocupação dos frades  era a ação “soteriológica” da Igreja, da qual eram os ministros. Na evangelização da América Latina o sacramento do batismo foi central, pois era a forma de salvar imediatamente as almas do inferno. A ação mistagógica, a iniciação nos mistérios da fé era um segundo passo. Numa situação tão especial, com tantas dificuldades a serem vencidas, começando pelo número de missionários, este primeiro contato era fundamental.
Frei Bernardo e Alonso planejavam permanecer em meio aos índios por um bom tempo. Nesse sentido, a fundação das “casas de doutrina” ou dos “recolhimentos” para homens e mulheres eram os meios ordinários para continuar o aprofundamento da catequese, àqueles que já haviam recebido o batismo. Nestas casas, conhecidas também dos jesuítas, os índios, já batizados, poderiam aprofundar sua fé, tendo, aí sim, um conhecimento maior das verdades cristãs, chegando a uma fé madura, a uma adesão pessoal e profunda.
O exagerado otimismo e até um certo idealismo do frade em relação à missão, como aparece na carta, nos colocam também alguns questionamentos. Conflitos, pecados e desvios dos índios quase não  aparecem. E não é porque não os tivessem. Uma resposta a todo esse otimismo é o próprio objetivo da carta, que é conseguir ajuda, convencer as autoridades a mandar mais frades, além de conseguir colonos para trabalhar na terra. Ora, se o autor expusesse a dura realidade que presenciava, certamente assustaria os eventuais candidatos. Por outro lado a carta foi escrita apenas alguns meses após a chegada dos frades, o que certamente não lhes permitia fazer um profundo diagnóstico da realidade. Outro elemento a destacar é que não podemos comparar os conflitos enfrentados pelos missionários junto às populações indígenas das florestas do Brasil, com os conflitos enfrentados pelos missionários que atuavam em meio às culturas antropologicamente mais avançadas, como os astecas, maias e incas. O mais interessante, porém, é que os fatos mostram que, mesmo após conviver com os índios por vários anos, certamente conhecendo seus pecados e desvios, os frades continuavam defendendo-os contra as injustiças do sistema colonial.
Um discurso mais ancorado nas ciências históricas poderia aprofundar a relação de frei Bernardo e frei Alonso com a corrente do humanismo renascentista europeu, em voga na Espanha e Europa naquele momento histórico, certamente conhecido pelos frades, e que inspirou o projeto dos franciscanos que atuaram nos primórdios da Evangelização do México. É legítimo também se questionar sobre a relação dos frades de Laguna com todo o processo de reforma católica, que exatamente neste momento está dominando a vida religiosa na Europa, particularmente a Espanha, e que gerou personagens fascinantes, como Tereza D’Avila, São João da Cruz, Inácio de Loyola, e o próprio franciscano Cardeal Cisneros, que com tanto zelo se ocupava da reforma da Igreja nos domínios espanhóis. Lembremos que estamos às vésperas do Concílio de Trento (1545-1563) e Inácio de Loyola havia acabado de fundar a Companhia de Jesus (1534). É lícito perguntar até que pontos estes elementos de contexto impulsionaram ou inspiraram estes frades no seu serviço aos índios nas longínquas paragens do litoral sul do Brasil.

8. Conclusão
Ao falarmos de missão e evangelização poderíamos recorrer a vários testemunhos de frades que, desde os primórdios da chegada dos portugueses, atuaram junto aos habitantes do Brasil, fossem eles índios, colonos ou escravos negros. Grandes nomes poderiam ser lembrados, nos mais variados campos de atuação. Frades se destacaram no mundo das letras, da educação, da pregação, da missão, na vida de santidade. Ilustres intelectuais, como frei Vicente de Salvador, que mereceu o epíteto de “Heródoto brasileiro”, por ter saído de suas penas a primeira história do Brasil; frei Jaboatão, ideólogo de um “Novo Orbe Seráfico Brasílico”; frei Veloso, que subindo serras e montanhas, percorrendo rios e vales, catalogando a “Flora Fluminensis”, criou uma obra estupenda, fazendo dele o primeiro botânico brasileiro; frei Francisco do Monte Alverne, cujo manejo da palavra e da retórica impressionou imperadores. Poderíamos citar ilustres missionários que catequizaram nações indígenas inteiras, ou outros, que deixaram obras grandiosas, como o convento de Santo Antônio do Rio de Janeiro, que neste ano completa 400 anos de existência. Poderíamos apresentar grandes vultos de santidade, como o santo frei Galvão. Optamos pela experiência de Laguna porque acreditamos que esta, em sua simplicidade, fragilidade e precariedade, pode  nos dar excelentes indícios sobre como nós, franciscanos, podemos anunciar o Evangelho no século XXI.