2 de junho de 2013

Ano da Fé - O símbolo da fé

Por Frei Alberto Beckhäuser 

Em outra oportunidade refletimos sobre o “Mistério da Fé” celebrado e vivido na Liturgia em geral e particularmente na Eucaristia.

Neste ano da fé convém que nos debrucemos também sobre o “Símbolo da fé”, também chamado “Símbolo dos Apóstolos”, o “Creio em Deus”, o Creio em Deus Pai, Creio em Deus Filho e Creio em Deus Espírito Santo. O “Creio” vale para as três Pessoas da Santíssima Trindade.

1. Várias expressões da fé

Desde os tempos apostólicos temos várias expressões ou enunciados da fé cristã. Primeiramente a de São Paulo na Primeira Carta aos Coríntios:

Trago-vos à memória, irmãos, o evangelho que vos tenho anunciado, que recebestes e no qual estais firmes. Por ele sereis salvos, se o conservardes como eu vo-lo anunciei. De outra forma, em vão teríeis abraçado a fé. Eu vos transmiti, em primeiro lugar, o que eu mesmo recebi: que Cristo morreu por nossos pecados, segundo as Escrituras; que foi sepultado; que ressuscitou ao terceiro dia, segundo as escrituras; que apareceu a Cefas e depois aos Doze  (1Cor 15,1-5).

O Credo responde também ao que São Paulo escreve na Carta aos Efésios:

 Assim já não sois estrangeiros e hóspedes, mas concidadãos dos santos e membros da família de Deus, edificados sobre o fundamento dos apóstolos e profetas, tendo por pedra principal o próprio Cristo Jesus. É nele que todo edifício, harmonicamente disposto, se une e cresce até formar um templo santo no Senhor; nele vós também sois integrados na construção para vos tornardes morada de Deus no Espírito (Ef 2,19-22).

Temos uma primeira Regra da fé que era professada na celebração do batismo de adultos e hoje usada no batismo de crianças. A profissão era feita no próprio ato do batismo através das perguntas: Crês em Deus Pai ? Crês em Jesus Cristo? Crês no Espírito Santo?

Depois temos o “Credo” dos Apóstolos ou Símbolo apostólico, proveniente de um Símbolo batismal da Igreja de Roma que foi ampliado pelos concílios de Niceia e de Constantinopla. Por tradição era atribuído aos apóstolos.

O Símbolo niceno-constantinopolitano, em geral, chamado Credo, surgiu em ambiente polêmico, resultado da reflexão teológica em defesa da fé cristológica e trinitária, fixada nos concílios de Niceia e de Constantinopla. Em Roma, só foi aceito na Missa no ano de 1014.

Finalmente, temos o chamado Símbolo atanasiano, atribuído a Santo Atanásio, de origem bem posterior, provavelmente no sul da França. Até a reforma atual da Liturgia era usado na Festa da Santíssima Trindade. Hoje, já não é mais usado na Liturgia.

2. O Símbolo Apostólico

Queremos deter-nos no Símbolo apostólico ou no Creio em Deus. Ele surgiu pelo século III em ambiente batismal nos ritos das entregas durante o catecumenato.

É chamado símbolo por ser um enunciado dos artigos de fé nas Igrejas cristãs. Símbolo porque contém, revela, evoca e representa a fé cristã. Constitui a Regra da fé para uso da comunidade. No Brasil, o Símbolo apostólico é aprovado também para ser professado na Missa. Convém notar que no Ocidente o Credo só foi introduzido na Missa depois que se perdeu o sentido da profissão de fé trinitária na Oração eucarística e o cânon da Missa era dito em silêncio. Portanto, a Oração eucarística também é lugar de professar sempre de novo a fé cristológica e trinitária cristãs.

O Creio em Deus permaneceu na Liturgia batismal. Muito cedo, porém, passou para a devoção individual ou familiar, bem como para as devoções populares como o Santo Rosário. Começou a fazer parte, por exemplo, da Oração da manhã ou Oração da noite individual e familiar.

Na Liturgia tudo era latim. Na piedade popular fizeram-se as traduções. Por isso, podemos dizer que o Símbolo dos Apóstolos foi o grande veículo da transmissão da fé através das gerações. Onde aprendemos a professar a nossa fé? Certamente guiados por nossos pais e, sobretudo, por nossas mães.

A fé é transmitida de geração em geração. Ela é  transmitida no batismo, ela nasce no batismo da água e do Espírito Santo. Trata-se de uma das virtudes teologais. Mas, é alimentada desde a infância e desabrocha na iniciação e na prática da vida eucarística. A fé constitui um dom de Deus, que dá sentido à nossa existência e ao qual somos chamados a corresponder.

3. Uma profissão de fé trinitária e cristológica

Valeu a pena ter lido recentemente um livro do nosso confrade espanhol Frei Francisco Martínez Fresneda, OFM, membro da Equipe de Liturgia da Ordem, intitulado El Credo Apostólico: Por Cristo, con Cristo y en Cristo, San Pablo, Madrid 2011. Trata-se de uma abordagem do Credo em chave cristológica e bíblica.

Mostra o nosso confrade como o “Credo” dos Apóstolos provém de um Símbolo batismal da Igreja de Roma, que foi ampliado pelos concílios de Niceia e de Constantinopla. Está dividido em doze artigos que a tradição atribui aos Doze Apóstolos. Sem dúvida, a lógica interna do Símbolo constituída pela profissão de fé na Trindade, segundo as últimas palavras que Jesus dirige a seus discípulos antes de subir para a glória do Pai: “Ide, pois, fazei discípulos meus todos os povos, batizando-os em nome do Pai e do Filho e do Espírito Santo, ensinando-os a observar tudo quanto vos mandei” (Mt 28,19), e que na História da Salvação, constituem o centro da criação, da redenção e da salvação.

Não obstante a clara divisão do “Credo” segundo as três Pessoas da Trindade, o Autor o enfoca de uma maneira cristológica, visto que a revelação cristã e, portanto, o “Credo”, parte da história e da doutrina de Jesus. E aqui temos o novo, o original da abordagem do “Creio”. Trata-se de uma abordagem toda ela bíblica e cristológica. Apresenta-se um tratado bíblico sobre a Santíssima Trindade ou se quisermos, um tratado de Cristologia todo baseado na Sagrada Escritura.

Para cada artigo de fé abordado ele oferece o contexto escriturístico e dogmático correspondente tratando, em seguida, de sua atualidade na experiência de fé.

O Autor expõe a matéria em quatro capítulos:

No Capítulo I, chamado Creio em…, o autor mostra em que consiste a fé, a dimensão subjetiva da fé que inclui a confiança, a fidelidade, a obediência; a fé de Abrão; Maria, exemplo de mulher de fé; a fé de e em Jesus. Passa, em seguida, a tratar da dimensão objetiva da fé e a confissão de fé.

O Capítulo II se intitula: Creio em Deus Pai. O autor trata das religiões vizinhas de Israel, o Deus de Israel, ou seja, o Deus da Aliança, o Deus como Pai de Israel e o Deus de Israel como centro da vida e da fé de Jesus. Passa a tratar de Deus Pai em Jesus: Deus distinto da Criação como o Criador, o Providente e Salvador; o Pai de Jesus, Doador de bens e obediência, Oração de júbilo e tentação no Getsêmani; Deus Pai é Abba; o Pai é bondade e amor; Todo-poderoso, Criador do céu e da terra, onde trata dos dados atuais da ciência e da Criação em Cristo Jesus.

O Capítulo III é central: Creio em Deus Filho. Os principais temas tratados: Jesus, Cristo, o Messias nos tempos de Jesus, o Messias nos Evangelhos, Jesus Cristo em São Paulo. Depois, citando apenas os tópicos principais: Único Filho, nosso Senhor; Concebido por obra e graça do Espírito Santo, nasceu da Maria Virgem; a Vida de Jesus; Padeceu sob o poder de Pôncio Pilatos; Foi crucificado, morto e sepultado; Desceu aos infernos; ao terceiro dia ressuscitou dos mortos; Subiu aos céus e está sentado à direita do Pai; Donde há de vir para julgar os vivos e os mortos.

O Capítulo IV tem como título: Creio em Deus Espírito Santo, com os seguintes subtítulos: Creio no Espírito Santo; a santa Igreja Católica; a Comunhão dos Santos; o perdão dos pecados; a ressurreição dos mortos e a vida eterna.

Em 391 páginas o autor procurou expor, de uma forma simples e clara a relação criadora, salvadora e santificadora que Deus estabeleceu com o homem na história concreta de Jesus de Nazaré. E conclui o autor: “Jesus, que confessamos como a encarnação do Verbo eterno de Deus, é o veículo de acesso ao Pai e quem nos dá seu Espírito, que é o mesmo Espírito do Pai. E se é Jesus quem nos oferece uma visão nova de Deus e nova do Espírito, também, com sua vida e doutrina, nos dá um novo sentido que nos conduz à plenitude de ser, à felicidade temporal e eterna. Assim acreditou sempre a comunidade cristã: ‘Eu sou o caminho, a verdade e a vida’ (Jo 14,6)”.

“Em conclusão, diz o autor, o Credo cristão é o relato de uma relação de amor, de um diálogo cordial de Deus conosco e de nós com Ele para viver de uma forma nova. Por isso, ao falar de Deus Pai, Filho e Espírito no Credo, descrevemos qual deve ser nosso sentido de vida e quais são as propostas divinas para alcançar nossa felicidade”.

O evangelista Marcos nos conta que o pai do menino epiléptico endemoniado prostrou-se aos pés de Jesus e exclamou: “Eu creio, mas ajuda a minha falta de fé” (Mc 9,24). Penso que nos cabe fazer o mesmo. A oração diária do Creio em Deus poderá constituir um grande meio para este permanente mergulho em Deus.

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