Sexta-feira da Paixão
Quem vai nos levar até o fundo mistério da sexta-feira das dores é São Bernardo de Claraval.
“Nós o vimos, diz a Escritura, e não tinha beleza nem atrativo para olharmos. O mais belo dos filhos dos homens tornou-se objeto de horror, semelhante a um leproso; o último dos homens, verdadeiramente o homem das dores, ferido por Deus e humilhado, sem graça nem beleza. O último dos homens que é o primeiro! Humilhado e exaltado! Ó opróbrio dos homens e glória dos anjos! Ninguém mais elevado e ninguém mais rebaixado! Foi coberto de escarros, saturado de injúrias, condenado à morte mais vergonhosa e contado entre os malfeitores (Is 53, 12). Essa humildade infinita ficará sem mérito algum? Assim como a paciência de Cristo é única, sua humildade é admirável, ambas sem precedentes.
Uma e outra adquirem ainda maior esplendor se considerarmos sua causa: O imenso amor com que Deus nos amou (Ef 2,4). Para redimir o escravo, o Pai não poupou seu Filho, nem o Filho a si mesmo. Realmente que amor imenso, que excede a qualquer medida e modo, e supera qualquer outro amor! Nada ilustra mais sua paciência e sua humildade como o fato de ter-se entregue à morte e ter assumido o pecado de todos, orando ainda pelos culpados a fim de que não morresse. Essa palavra é digna de fé e de toda acolhida (1Tm 1,15, 4,9): tornou-se oblação porque ele mesmo quis. Não se deve apenas dizer que quis e se tornou oblação, mas porque ele quis, tornou-se oblação (Is 53,12: Vulg). Pois somente ele teve o poder de dispor de sua vida: ninguém a tirou, ele ofereceu-a espontaneamente.
Tendo tomado vinagre, Jesus disse: Está consumado (Jo 19,30). Todas as coisas se realizaram, não tenho mais nada a fazer. E inclinando a cabeça – obediente até à morte – entregou o espírito (Jo 19,30) Na verdade, que homem pode adormecer na morte, por sua espontânea vontade? Que grande fraqueza é morrer, mas morrer assim que força imensa! Com efeito, o que é fraqueza de Deus é mais forte do que os homens (1Cor 1,25). Somente poderia assim entregar-se à morte aquele que por seu próprio poder iria retornar à vida. Somente podia dar sua vida aquele que podia igualmente retomá-la, pois tem o poder sobre a vida sobre a morte
Lecionário Monástico III, p 556-557
Frei Almir Ribeiro Guimarães
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