Depois que o Altíssimo Pai celestial, por sua misericórdia e graça, se dignou iluminar meu coração para fazer penitência segundo o exemplo e ensino de nosso bem-aventurado pai Francisco, pouco depois de sua conversão, com algumas irmãs que Deus me dera logo após a minha conversão, eu lhe prometi obediência voluntariamente, como o Senhor nos concedera pela luz da sua graça através da vida admirável e do ensinamento dele.
Vendo o bem-aventurado Francisco que nós, embora frágeis e fisicamente sem forças, não recusávamos nenhuma privação, pobreza, trabalho, tribulação, nem humilhação ou o desprezo do mundo, e até julgávamos tudo isso as maiores delícias, como pôde comprovar freqüentemente em nós a exemplo dos santos e dos seus frades, alegrou-se muito no Senhor.
E movido de piedade para conosco, assumiu o compromisso, por si e por sua Ordem, de ter sempre por nós o mesmo cuidado diligente e a mesma atenção especial que tinha para com seus irmãos.
E assim, por vontade de Deus e do nosso bem-aventurado pai Francisco, fomos morar junto da igreja de São Damião, onde em pouco tempo o Senhor nos multiplicou por sua misericórdia e graça, a fim de que se cumprisse o que tinha predito por seu santo. Pois antes tínhamos morado em outro lugar, embora por pouco tempo.
Depois escreveu para nós uma forma de vida, principalmente para que perseverássemos sempre na santa pobreza. E não se contentou em exortar-nos durante a sua vida com muitos sermões (cfr. Act 20,2) e exemplos ao amor e observância da santa pobreza, mas nos deu muitos escritos, para que depois de sua morte não nos desviássemos dela de modo algum, como o Filho de Deus, enquanto viveu neste mundo, não quis jamais afastar-se da santa pobreza.
Também o nosso bem-aventurado pai Francisco, imitando os seus passos (cfr. 1Pd 2,21), pelo exemplo e pelo ensinamento, nunca se desviou, em toda a vida, de sua santa pobreza, que escolheu para si e seus irmãos.
Por isso eu, Clara, serva de Cristo e das Irmãs Pobres do mosteiro de São Damião, embora indigna, e verdadeira plantinha do santo pai, considerando com as minhas outras Irmãs a nossa tão alta profissão e o mandamento de tão grande pai, como também a fragilidade de outras, que temíamos em nós mesmas depois do falecimento do nosso pai São Francisco, que era a nossa coluna e única consolação depois de Deus e o nosso apoio (cfr. 1Tm 3,15), repetidas vezes fizemos nossa entrega voluntária a nossa santíssima Senhora Pobreza, para que, depois de minha morte, as Irmãs que estão e as que vierem não possam de maneira alguma afastar-se dela.
E como sempre fui cuidadosa e solícita em observar a santa pobreza que prometemos ao Senhor e ao nosso bem-aventurado pai Francisco, e em fazer que fosse observada pelas outras, assim sejam obrigadas até o fim aquelas que vão me suceder no ofício a observar e fazer observar sua santa pobreza, com o auxílio de Deus.
Para maior segurança, tive a preocupação de conseguir do senhor papa Inocêncio, em cujo tempo começamos, e dos seus outros sucessores, que corroborassem com os seus privilégios a nossa profissão da santíssima pobreza, que prometemos ao Senhor e ao nosso bem-aventurado pai, para que em tempo algum nos afastássemos dela de maneira alguma.
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