Atualidade de São Pedro de Alcântara.
Pode um homem como São Pedro de Alcântara dizer-nos alguma coisa a nós, que fazemos parte de uma sociedade que não gosta de perguntas, e muito menos de respostas, sobre o único necessário? Pode um homem como Pedro de Alcântara, em cuja vida se manifesta “suma pobreza, profunda humildade, desprezo e afastamento de tudo o que parecesse estar sendo dado de presente, comodidade pessoal e temporalidade” , dizer alguma coisa aos homens do final deste século e particularmente a nós, frades menores?Apesar da distância, que aparentemente parece existir entre São Pedro de Alcântara e nós, há aspectos de sua vida extremamente atuais. Entre todos, quero sublinhar três: homem de profunda contemplação, homem de constante busca e discernimento, homem a serviço dos outros como mestre espiritual.
1) Homem de profunda contemplação
São Pedro de Alcântara é um homem de Deus, é um gigante do espírito, porque deixou Deus crescer nele. A oração e a contemplação são o selo, o fundamento, a alma, o coração … é o tudo de sua vida. O espírito de oração e devoção constitui a grande prioridade – qualitativamente fa1ando – do projeto de vida da reforma alcantarina: tudo está em função dela e a seu serviço. A penitência e a mortificação encontram seu sentido mais profundo como disposição para uma oração confiante de abandono, na qual o ser humano se coloca por completo nas mãos de Deus. Sua grande atividade apostólica brota da profunda comunhão com Deus, nascida e alimentada pela “oração de mais horas”. Este primado qualitativo, porém, traz consigo também o primado prático da oração. Esta há de ser a primeira ocupação e preocupação dos Irmãos.
Os homens de hoje, sobretudo nós frades menores, como São Pedro de Alcântara, precisamos redescobrir a beleza do “coração e mente voltados para o Senhor”. O mundo de hoje, marcado por um ateísmo favorável ao religioso, está nos pedindo aos gritos que sejamos testemunhas de Deus, que criemos lugares de experiência de Deus. Nosso futuro dependerá, em grande parte, da capacidade de testemunhar aos outros a presença de Deus. Como nos preparamos, pessoal e comunitariamente, para esse futuro? Como respondemos à vocação de sermos testemunhas de Deus numa sociedade marcada pela secularização?
2) Homem em constante busca e discernimento
Pedro de Alcântara foi um homem em caminho, “peregrino e forasteiro” (1Pd 2,11), não só em sentido físico, mas também, e sobretudo, por sua constante atitude de discernimento e de busca da vontade do Senhor. Porque foi pobre e livre, viveu sempre e inteiramente disponível para o Senhor; porque experimentou a eficácia libertadora da pobreza, se sentiu sempre itinerante, disposto a abandonar atividades, ofícios e estruturas que não respondiam à sua vocação de frade menor.
Os homens de hoje, particularmente os frades menores, precisamos recuperar a liberdade que a pobreza nos dá; recomeçar a itinerância que estimula a criatividade; reacender o anseio pela pátria que nos força a deixar estruturas envelhecidas; abandonar seguranças que nos amarram e certezas que nos imobilizam. Como São Pedro de Alcântara, o discernimento do que o Senhor nos está pedindo aqui e agora há de ser a nossa constante preocupação. Não basta sermos fiéis: o Senhor nos pede uma fidelidade criativa. São Pedro de Alcântara nos ensina a viver abertos àquilo que o Espírito nos pede hoje para sermos fiéis a Cristo, que nos chamou, fiéis a Francisco, que é nosso modelo no seguimento, fiéis ao homem de hoje, a quem temos de testemunhar, com palavras e obras, “que só Ele é onipotente” (CtaO 9).
3) Homem a serviço dos outros como mestre espiritual
São Pedro de Alcântara foi um homem que pôs a serviço dos outros os dons que tinha recebido do Senhor. Um homem em quem a graça do Senhor não foi vã e que fez frutificar os talentos recebidos não só em próprio benefício, mas também em favor dos outros, ajudando a todos que lhe pediam conselho nas coisas que agradam ao Senhor.
São Pedro de Alcântara foi um grande mestre espiritual, porque foi um homem de Deus. Ensinou os caminhos de Deus a partir de sua experiência de Deus. Teresa, a grande, disse de Frei Pedro: “Desde o começo vi que me entendia por experiência própria, e isto era tudo o de que eu precisava … ” E isto, porque “da vida de perfeição – afirma ainda Santa Teresa na sua Autobiografia – só se pode falar com aqueles que a vivem”. Só quem vive na luz pode “iluminar tudo”. Só pode comunicar Deus quem nele vive.
No mundo de hoje há muitas pessoas, sobretudo jovens, que têm grande fome de Deus. Cabe a nós saciar essa fome a partir de uma profunda experiência daquele que é amor. Cabe a nós conduzi-los aos poços de água viva para saciar sua sede de eternidade. Cabe a nós acompanhá-los para que descubram que aquele, a quem buscam, caminha a seu lado; que aquele, por quem suspiram, pede para permanecer em sua casa.
Celebrar significa fazer memória, e fazer memória significa atualizar aquilo que celebramos e aquilo de que fazemos memória. Celebrar e fazer memória de São Pedro de Alcântara exige de todos nós colocar-nos a caminho para viver, encarnando-as em nosso tempo, as prioridades de seu projeto de vida, que não são diferentes das do projeto de vida de Francisco de Assis.
Isto é o que imploramos da Virgem Mãe, a quem invocamos com a mesma oração que lhe dirigia São Pedro de Alcântara: “Ó Virgem Santíssima, Mãe de Deus e Rainha do céu, Senhora do mundo, Sacrário do Espírito Santo, Lírio de pureza, Rosa de paciência, Paraíso de delícias, Espelho de castidade, Modelo de inocência! Rogai por estes pobres desterrados e peregrinos e derramai sobre eles as sobras de vossa superabundante caridade!”
Trecho da Carta do então Ministro Geral da OFM, Frei Giacomo Bini, em outubro de 1999, por ocasião do V Centenário de Nascimento de São Pedro de Alcântara.
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